Cultura japonesa: Gustavo Eda, Grupo Min, Yayu Fish e outros temas
Relembrando meu professor, falando do Grupo Min e de quando me tornei, temporariamente, um empreendedor cultural
Bem-vindo. Neste v(1) n(38) volto a um tema que aparece pouco por aqui (mas aparece!) que é a cultura japonesa e, ao contrário do que a turma espera, não falarei nem de sushi, nem de mangás. Digamos que, hoje, vou fazer aqui um depoimento pessoal e aproveitar para apresentar a você algumas personagens interessantes do mundo cultural nipo-brasileiro.
Boa música, bom professor: um depoimento pessoal - Gustavo (melhor conhecido como Gustavo Eda) é um sujeito das músicas. Quando, em algum momento dos anos 2000, retornei ao karaokê da colônia, conheci o Gustavo.
As sessões de karaokê da colônia ocorriam aos sábados (acho que eram quinzenais) e eram os pontos altos da minha diversão. Bons tempos! E o Gustavo? Ele era impressionante.
Conhecia o mesmo repertório de música Enka (演歌) que eu (a interseção era incrível), cantava muito bem e seus interesses na cultura japonesa iam além. Era uma referência de tudo o que dizia respeito ao Japão1. Se eu tivesse um filho, dizia brincando, queria que fosse o Gustavo.
Passei-lhe alegremente meu cargo de “mascote” do karaokê (é, eu era o mais novo, na época, com uns 40 anos). Não custou muito, perguntei a ele se não me daria umas aulas de canto e a resposta foi positiva.
Por anos, uma vez por semana, a gente treinou várias músicas em diversos estilos: Enka (que eu diria que é um subgênero da “MPJ”, ou seja, Kayou (歌謡)), Minyou (民謡) - que são as músicas folclóricas - e até alguns J-Pop (acho que um ou dois). Sendo mais específico, foram muitas músicas folclóricas, alguns Enka e um ou outro J-Pop.
As aulas, que já eram ótimas, melhoraram mais (se é que isso é possível…) quando ele, finalmente, decidiu enfrentar o curso de música na universidade. Era fácil ver que não iria parar com um diploma na mão.
Logo, logo, foi-se para a Alemanha (não sem antes me ajudar em algumas conquistas importantes nos campeonatos de música folclórica), terminou seu mestrado em música e por lá tem permanecido, com sucesso. A partir de então, ficou um pouco mais difícil fazer aulas com ele (o correto é: impossível).
Por fim, tenho orgulho de dizer que se há uma “Escola Gustavo Eda” de música folclórica japonesa, eu fui, provavelmente, seu primeiro aluno. Claro que sou-lhe grato, né? Nem preciso dizer. A cada novo treino, as lições do Gustavo reverberam.
Mais Gustavo - A bela música Sakura de Naotaro Moriyama. O minyouTsugaruAiya Bushi. Ah, e tem Wagner também. Lohengrin. Também a Sake to Namida to Otoko to Onna, do falecido Eigo Kawashima. Dê um passeio pelo canal dele que você verá o que é, de fato, variedade de repertório musical. O sujeito não é bolinho não.
Música folclórica japonesa é coisa de jovem sim! - A propósito, caso você se interesse por música folclórica japonesa (reconheço que é um tema para lá de específico), vale a pena acompanhar o trabalho do Grupo Min.
Alguém ainda vai contar a história do Grupo Min em livros ou artigos. Surgiu, não para minha surpresa, em São Paulo pela união, aí sim, surpreendente, de jovens interessados na música folclórica japonesa que existe além dos tambores (Taiko太鼓 )2.
O grupo tem contado com a colaboração de dois professores das duas grandes associações de música folclórica japonesas do Japão que, talvez algo surpreendentemente, têm filiais no Brasil. São elas a Nihon Minyou Kyoukai( 日本民謡協会) e a Kyoudo Minyou Kyoukai (郷土民謡協会).
Os professores? São eles: Tsukasa Kaitou (Nihon Minyou) e Tamie Kitahara (Kyoudo Minyou). Quem já passou por algum evento musical japonês em São Paulo sabe do que estes dois são capazes. Generosos e rigorosos, são legítimos símbolos do ensino nipônico.
Antes da pandemia, o Grupo Min3 conseguiu o incrível feito de fazer um show no MASP com dois cantores japoneses, o evento Mukai (Mar dos Sonhos). Foi um ‘sonho’ (ok, ficou engraçado) realizado ver a música folclórica no MASP, com um grupo misto de japoneses, descendentes e entusiastas.
Yayu Fish, Gustavo e eu - Para finalizar nossa rodada de música folclórica japonesa, eis um fato curioso. Não disse antes, mas, em 2011, eu e o Gustavo (o mesmo do tópico anterior) também promovemos, sem patrocínio algum (contando apenas com a vontade de fazer turismo da dupla Yayu Fish), uma apresentação no Conservatório da UFMG de música folclórica com os ótimos arranjos jazzísticos do “Fish” da dupla (o simpático Eiji Uozumi). Deixei no YouTube toda a apresentação.
Meu sonho seria que, de maneira mais profissional, trouxéssemos a dupla Yayu Fish para o Brasil novamente para um futuro show. É um sonho que ainda tenho.
Gostou? Já tinha ouvido falar de música folclórica japonesa? Sinta-se à vontade para deixar seu comentário.
Escove os dentes! - Alan Blinder (ex-manda-chuva do FED) escreveu, há muito anos, um artigo bem-humorado sobre como escovar os dentes aumentaria seu bem-estar. Sim, ele publicou no respeitadíssimo Journal of Political Economy, o que nos diz muito sobre a qualidade editorial comparada entre acadêmicos brasileiros e norte-americanos.
Eu diria até que é uma diferença entre a postura de cientistas de países da América Latina e do mundo anglo-saxão. Para mim, é um ensinamento básico do (meu) manual do bom pesquisador: você não deve se levar muito a sério4.
De todo modo, eis um contraexemplo ao que acabo de dizer: um editor corajoso publicou o (igualmente bem-humorado e muito menos famoso) artigo que escrevi com o Ari F. de Araujo Jr. Trata-se de uma pequena adição ao modelo de Blinder seguindo uma sugestão do próprio: a inclusão da herança. Quer saber mais? Só clicar aí e ler.
A propósito, outra característica bizarra da academia, pelo menos da brasileira, é a constante ‘fuga da responsabilidade’. Ao contrário dos artigos científicos (minha amostra é a da Ciência Econômica) produzidos em parte do mundo civilizado, por aqui a “recomendação” (= vou tirar seus pontos se não fizer isto!) é que o autor não fale nunca na primeira pessoa.
Por exemplo, em artigo no qual o autor (mesmo que seja o único autor) “encontre” evidências a favor ou contra sua hipótese, as recomendações são as de que jamais reivindique a autoria (“eu encontrei que…”). A recomendação é que use o vago “encontramos” ou o ensaboado “encontra-se”.
Acho isso tão desnecessário quanto desestimulante. Um pesquisador deveria ter o direito (e o fardo) de reinvindicar para si o bônus (e o ônus) de seu próprio trabalho. A retórica, inclusive, parece-me mais agradável quando leio um pesquisador que assume seu trabalho, expondo-se diretamente às críticas. Minha esperança é que os próprios pesquisadores, aos poucos, mudem este hábito…
Funcionário do mês - Pela sua determinação no cumprimento das ordens, Hiroo Onoda. Imagina um Hiroo Onoda entregador do aplicativo? Seria 5 estrelas. Impecável sempre. Seu apelido seria, claro, Hiroo, o Matador (pun intended).
Inteligência ou genialidade? - Uma breve e interessante reflexão sobre o que é ser um gênio. Do mesmo autor, a importância das boas ideias (e o fato de que elas não são tão abundantes assim).
Mercado desalmado - Eis um belo exemplo da imparcialidade do mercado. Em Três Episódios Marcantes das Bolsas do Brasil, de Ney Carvalho, conta-se que, dois dias após a morte do presidente Costa e Silva a bolsa subiu (chegando a 928 pontos).
Discriminação educativa em uma única imagem - A seguir.
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Yoshiko Yamaguchi - A complexa história de Yoshiko Yamaguchi, também conhecida como Li Hsiang Ian, Pan Shu Hua e Shirley Yamaguchi. Nascida no então dominado estado colonizado de Manchukuo (Manchúria), a atriz e cantora de algumas das músicas mais populares do Japão dos anos 30 e 40 teve uma vida, digamos assim, bem agitada.
Governança Radical - Meu texto explicando o que entendo por governança radical foi mencionado (elogiosamente, no caso) por gente do porte de Diogo Costa e Alexandre Soares Silva. Modéstia à parte, até acho que ficou um bom texto, no sentido de se propor a esclarecer um termo desconhecido do público. Caso não tenha lido ainda, é só seguir o link.
Bem, chegamos ao fim deste número. Voltamos sábado. Gostou? Por que não assinar e compartilhar? Ajude o autor a espalhar a palavra. De todo modo, a gente se encontra no final de semana.
Conheci o Excel Saga por causa dele. Talvez o anime mais non-sense de todos os tempos.
Houve uma época da vida que cheguei a imaginar que descendente de japonês na faixa dos 20 anos só gostava de Olodum.
Na verdade, foi uma fusão de grupos. É que há uma grande interseção entre os que cantam músicas folclóricas em geral e os que pertencem a grupos específicos (que só cantam uma música). Mas o ponto a se destacar é que a juventude do Min é onipresente.
Um dia eu farei uma lista dos artigos científicos bem-humorados que já li e, adianto a vocês, nenhum deles foi publicado em português porque, sabe como é, o mais importante é a formatação da página e não usar a primeira pessoa do singular. Exceção honrosa, claro, feita ao editor que mencionarei nas próximas linhas, que publicou dois artigos de mesmo tom em um periódico nacional. Volta logo para o texto!