Com Aynitta só se vive duas vezes: a entrevista (e outros temas, claro).
Ah, as luzes da fama...
Aqui estamos com o v(1), n(66). Aos que gostam de Aynitta, temos uma inédita entrevista da mesma em um talkshow de famosa jornalista (ao menos no meu universo). Além disso, como sempre, um pouco do que achei interessante no Substack e outros assuntos.
p.s. ah sim, #juobananerepresidente segue a todo vapor! No v(1), n(65) tivemos já uma primeira polêmica em torno do cenário eleitoral.
Com Aynitta só se vive duas vezes - Conforme prometido, eis Aynitta, novamente. Aynitta foi uma ideia que tive há algum tipo, para uma Ayn Rand brasileira. Era só um trocadilho e se transformou em personagem.
Aos poucos, ganha forma. Esta deve ser a terceira vez em que retomo Aynitta. Desta vez, com ares Jamesbondianos. Lá vamos nós então para: Com Aynitta só se vive duas vezes.
O hip-hop da Aynitta foi um sucesso no colégio. Animada, resolveu colocar a música em plataformas como o Deezer, Spotify etc. O sucesso, novamente, sorriu-lhe. Da noite para o dia, a jovem Aynitta saiu do anonimato da favela para as paradas de sucesso.
Seus fãs aumentaram de uns poucos vizinhos e algumas turmas do colégio para milhares de adolescentes. Com os fãs vieram também os repórteres e os invejosos. Sim, porque com o grande sucesso vem também a concorrência e, claro, grandes responsabilidades.
Em poucos meses, a jovem Aynitta já era convidada para programas de TV e até para propagandas de produtos de marcas famosas. Mas foi em um destes programas famosos de entrevistas que Aynitta ganharia sua primeira seguidora na grande mídia brasileira, a famosa jornalista Juliana Campoverde.
A jornalista, Juliana Campoverde, dona de um talkshow de muito sucesso, não era muito de questionar os entrevistados. Claro, havia também a diretriz do pessoal do marketing da empresa de não ser muito incisiva com perguntas dirigidas a estes (reforçada por vários pedidos de um departamento jurídico sempre obcecado com as redes sociais).
Mas era sempre pelo seu programa que passavam os jovens talentos. É de se imaginar o impacto que uma boa entrevista daria à carreira de nossa heroína. Para aplacar a sua curiosidade - presumo que seja, senão um fã Aynittiano, ao menos um leitor curioso - reproduzo a entrevista, na íntegra. Garanto que respeitei todos os protocolos legais para a reprodução de conteúdo alheio e que nenhuma Juliana Campoverde foi ferida ou morta durante a transcrição desta entrevista.
Juliana Campoverde - Cara Aynitta, é uma honra tê-la aqui. Mulher, tão jovem e, nem preciso dizer, um sucesso! Para começar, diga-me: como você define sua música?
Aynitta - Minha música, em essência, é o conceito do homem como um ser heroico, com sua própria felicidade como o propósito moral de sua vida, com sua realização produtiva como sua atividade mais nobre e a razão como seu único absoluto.
Juliana Campoverde - Aynitta, qual é a função social da sua música?
Aynitta - Juliana, sei que sou nova, mas entendo que, em uma sociedade capitalista, todas as relações humanas são voluntárias. Os homens são livres para consumir minha música ou não. Não vejo função social mais bela, esteticamente do que servir para que as pessoas percebam isto.
Juliana Campoverde - Ah sim, você falou ‘homens’. E as mulheres? As outras pessoas…
Aynitta - Juliana, é muito óbvio para mim que por ‘homens’ eu não me referi apenas aos homens. Deixa de bobagem. A humanidade é uma só. Você respeita isto?
Juliana Campoverde - Ah, bem, não é bem assim, a humanidade é muito…não consigo elaborar muito sobre isto e…ei, Aynitta, você é a entrevistada aqui, querida! Então, fale-me de sua música. Pretende pedir um dinheiro do governo no programa de Empoderamento Governamental para sua arte?
Aynitta - Hum, boa pergunta Juliana. Veja, eu entendo que não existe tal entidade como “o público”, já que o público é apenas um número de indivíduos. Sei que alguns entendem que a ideia de que “o interesse público” substitui interesses e direitos privados. Mas eu não penso assim. Aliás, sempre digo que quem reivindica o direito de redistribuir a riqueza produzida pelos outros, reivindica o direito de tratar os seres humanos como bens móveis. Não acho que, por exemplo, as mulheres queiram isto…
Juliana Campoverde - Sim, sim! Não queremos! Quer dizer, eu não quero, mas acho que posso falar por todas as…
Aynitta - Não, você não pode. Mas…
Juliana Campoverde - Oh, sim, tem razão querida. Mas não podemos mais ter o fruto de nosso trabalho arrancado pelo governo que o gasta muito mal exceto, talvez, quando o assunto é a democratização e controle social da mídia…
Aynitta - Com sua licença, Juliana, eu discordo. Acho que o controle social da mídia não é uma boa ideia. Manifestações artísticas como a minha música não podem sofrer com restrições. A liberdade de expressão dos indivíduos privados inclui o direito de não concordar, de não ouvir e de não financiar os próprios antagonistas.
Juliana Campoverde - Nossa, Aynitta, acho tão enigmático quando você fala de ‘indivíduos privados’…
Aynitta - É que eu não quero estatizar minha mãe. Já pensou? Minha casa iria virar um bordel e minha mãe teria uns milhões de donos. Seria uma prostituta…
Juliana Campoverde - Hum, sempre fui contra as privatizações, mas não é que você tem razão? Nunca tinha pensado por este lado.
Aynitta - Eu imagino.
Juliana Campoverde - E o racismo, Aynitta? Sua música pode ajudar as pessoas a combater o racismo?
Aynitta - Bem, Juliana, veja. Minha música, espero, despertará o individualismo que é inerente a cada um de nós. Eu penso que o racismo é a forma mais primitiva e crua de coletivismo, por isto, acho que quem comprar minha música estará, também consumirá um pouco do meu sentimento antiracista.
Juliana Campoverde sentia-se estranha. Algo como aquela sensação de quem lê um livro como Minutos de Sabedoria e se vê possuído de um desejo imenso de caçar umas capivaras no mato. Ninguém saberia lhe dizer ao certo que sensação era aquela. Certamente não era umami.
De todo modo, não conseguiu parar de refletir sobre as heréticas ideias de Aynitta. No caminho de casa, colocou, novamente, o pendrive com a música de Aynitta e dirigiu uns vinte minutos. No dia seguinte, ao acordar, Juliana Campoverde era uma aynittiana convicta, ainda que não soubesse bem o que isto significava.
De algum modo, a entrevista e a música de Aynitta haviam despertado nela uma jornalista que morrera em algum momento de sua carreira, a despeito de seu sucesso. Sentia-se um pouco mais livre, dona de si. Nunca mais atendeu às ligações do pastor salafrário que pedia doações para sua falsa obra de caridade.
Aynitta, por sua vez, teve sua entrevista reverberada pelas redes sociais aumentando, ainda mais, sua base de fãs. A jovem cantora passara pelo seu primeiro teste no ardiloso mundo da mídia.
Sua escalada para o sucesso estaria longe de ser um suave vôo de um anjo em direção ao céu. Muitos invejosos surgiriam, loucos, não para competir com ela pelas paradas de sucesso. Estes seriam os bons invejosos, no pensamento de Aynitta. O problema está naqueles que querem calar um artista por conta de seus impulsos totalitários.
Naquele dia, o pôr do sol parecia especialmente belo. Mais que o normal. Era como se o sol sorrisse para Aynitta. Ao sair do estúdio, apreciou-o. Mais ainda, viu no sol uma antiga bola do jogo de queimada. Levantou o braço direito com o punho em riste, pulou e gritou: - A bola é minha!
FIM (por enquanto)
p.s. Sim, várias respostas de Aynitta foram copiadas ou parafraseadas daqui. Ah sim, quem já é assinante antigo sabe que a personagem já apareceu em duas ocasiões (aqui e aqui).
Black Light: uma série de quadrinhos em que a missão é eliminar o rent-seeking - A premissa das histórias da unidade Black Light é interessante: o presidente dos EUA a cria para que eles investiguem e eliminem operações ilegais em seu próprio governo.
Eu me peguei imaginando na mitigação dos efeitos do compadrio (capitalista ou não) e do rent-seeking como política de segurança pública no nível da ficção da 2000AD (esta ótima revista e quadrinhos britânica).
Pode não ser uma idéia (briguei com o ‘acordo’ ortográfico) de ficção original, mas grupos que combatem a corrupção (seja a mesma caracterizada pela existência ou não de rent-seeking) no próprio governo vivem no imaginário popular, não? Ou mesmo no passado (Eliott Ness contra Al Capone, por exemplo).
A meningite e sua sombra - Não sei se ter lido este conto - que encerra o Contos de Amor, de Loucura e de Morte - é uma experiência única porque é o último do livro ou porque ele é ótimo mesmo, independentemente de estar neste livro.
O que eu quero dizer é que me parece que há algo que nunca poderei saber (já que não é possível um contrafactual) sobre a experiência de ler o conto isoladamente, ou lê-lo após passar por todo o livro. Sensação de que existe aquele efeito ‘fechar com chave de ouro’…
Parece bobagem, eu sei, mas esta pergunta ficou me incomodando.
p.s. a tradução de Eric Nepomuceno para a Abril pode não ser igual à de outras edições do livro mas é sensacional. Você lê qualquer conto e tem aquela sensação de que está diante de algo muito bem redigido…em português, a despeito do livro ser traduzido do castelhano.
Criptotecnologia e os Estados (Governança Radical) - Balaji Srinivasan em um debate muito interessante na Foreign Policy. (veja a thread toda e depois me conte o que achou)
Vais fazer canoa, o cacete! - Uma oportuna reflexão do Pedro sobre atitudes algo estranhas que vejo diariamente.
Uma importante observação - Aliás, o mesmo Pedro em um testemunho de sua vida nos anos 90, termina com um importante alerta.
A perplexidade com que deixei aquela montagem em 1996, e que não era só minha, hoje também tem a forma de uma “guerra cultural” em que o lado da direita pode perfeitamente vestir a carapuça do Penteu de José Celso. Se abandonarmos investigações intelectuais só para demonstrar que aderimos a um pensamento que nos apetece, poderemos até ser, na superfície, diferentes daquele Baco, mas Eurípides mostrou que Baco e Penteu são muito mais parecidos do que imaginam.
É preciso escapar do maniqueísmo e da idolatria, claro.
Orlando tá on…mas meio lerdo - E a gente se diverte pela 29a nona vez. Ele acha que está lerdo mas, ainda assim, tem desempenho melhor que muito jovem por aí. Pudesse eu ler na metade de sua velocidade, já seria um sujeito mais feliz (neste aspecto, pelo menos).
BMW e ação! - John Woo, Tony Scott e Joe Carnahan: unidos pela BMW. O que poderia dar errado? Nada.
O mais didático vídeo sobre a eficácia da vacina - Tinha que ser do Family Guy. A TV brasileira simplesmente matou o desenho, empurrando-o para horários horrorosos (e forçando-nos à versão dublada, nem sempre tão boa quanto a original).
Achei mais didático e convincente que muita propaganda governamental.
Uigures - A nossa mídia, tão preocupada em se mostrar engajada em causas sociais (algumas, eu diria, bem pouco ‘sociais’) parece não enxergar o caso dos uigures. Não é porque um parceiro comercial adota práticas muito preocupantes contra minorias que eu preciso fingir que me sinto bem com isto…
Por hoje é só. A gente se vê no sábado ou, a qualquer momento, em edição extraordinária.
Talvez você seja novo por estas bandas. Rapidamente: publico duas vezes por semana, geralmente às quartas e sábados. Eventualmente há algumas edições extraordinárias. Assinar (custo = R$ 0.00 + valor do seu tempo para apertar o botão subscribe com seu endereço de e-mail lá…) me ajuda bastante. A temática? De tudo um pouco. Confira os números anteriores aqui.