Juó Bananére em campanha. As irmãs Cultura. Outros Despachos.
O Natal está chegando. O que você vai me dar de presente?
O volume 1 da newsletter teve 65 números (com este) sem contar algumas edições extraordinárias. Assim, neste v(1), n(65), temos um informe sobre um debate entre candidatos presidenciais e a curiosa história das irmãs Cultura. Outros despachos seguem-se.
Seja bem-vindo e vamos começar!
Juó Bananére p’ra presidentimu - Come vá ista forza, letôre? Altrodí io i o Dotôre Paligna pegamô u intomabile pr’á fazê una brutta intomabileata c’os intlettôre i acurreligionári. Foi un brutto festegiamento! A mia gandidatura p’rá presidentimo du Brazile é un stronddoso successo!
Ebbé! Ma come iva dizeno, io i us acurreligionári ‘stávamo tutto na intomabileata cuando encontré o juice M’oro, altro gandidato.
‘- Eh, M’oro. Come vá vucê?
- Intaliano increchêro! Pára di arrubá o mio inlettore!
- Ma che malinduccado! Impricantte!
- Gallaboca! Ingafagesto!
- Gallaboca giá muréu, chi manda chi só éu!’
Aóra intó u Dotôre Paligna cuidó di arrumá uns pastello i uns xoppis dupro i a impricació encerró. Os inlettore tutto ficaró dando us cumprimento pr’u dotôre Paligna chi é du futuro ministérimo du mio guberno.
Eh! Miglió tê pastello i xoppis pr’us juice! Chi gostozura é as inleçó!
Diretamente do túnel do tempo, por volta de 1933, cantava Juó Bananére nas páginas de um dos números do Diário do Abax’o Piques:
Non tê male chi sempre dura,
Né bene chi nunga si acaba,
I un dia a Dentadura
Inda vá virá sorvetti…
Bananére, agora, é candidato. O meu candidato. Já anunciou seu programa de governo (maravilhoso! Você não leu? Nossa, achei que você era um sujeito bem-informado…), seu ministério (idem). Esta é nossa primeira de uma série de relatos de sua pré-campanha (vitoriosa! Incrível! Estupenda!) que tanto sucesso faz (ao menos em minha mente) no Brasil!
A correr tudo bem, teremos mais em breve! Até lá, vamos subir a hashtag (vou redundantemente citá-la): #juobananerepresidente.
A Alta Cultura, a Baixa Cultura e o Pedro - Naquela época do ano chuva e sol eram uma constante, o que tornava o guarda-chuva um item importante. Obviamente, era um incômodo, um mal necessário, embora nem todos digam que se trata de um objeto de más intenções.
Outro dia mesmo, a senhora Alta Cultura, que havia ido ao centro de São Paulo (só consigo pensar em histórias na cidade de São Paulo, maldito Orlando!) perambulava pelas lojas com seu elegante guarda-chuva trazido de sua última viagem à Alemanha (Bayreuth! Ah, Bayreuth!) quando se viu no início de nossa história.
‘- Hum, mais uma história, Claudio?
- É, Alta Cultura, desculpe-me. Acordei cedo.
- Que horas são aí?
- Quase seis da manhã.
- Hum, aqui, na história são (olhando o relógio de bolso) oito e trinta e três.
- O comércio já deve estar aberto, não?
- Sim, sim. Passei pelo Conjunto Nacional há pouco.
- Tudo bem. Então vamos seguir com nossa narrativa, ok? Bom dia!
- Bom dia!’
E tendo conversado com o autor desta newsletter, a jovem Alta Cultura seguiu pela Avenida Paulista, elegantemente, com seu guarda-chuva que agora fazia papel de guarda-sol pois não mais havia chuva, mas sim um sol forte, de verão, com aquele calor típico dos finais de ano.
A Alta Cultura gostava muito de caminhar pela avenida Paulista nos finais de semana. Tinha como passatempo olhar detalhadamente os livros usados que alguns ambulantes vendiam na calçada. Vez por outra comprava um. Sua última compra, salvo engano, foi o Método Investigativo Infalível, de autoria do famoso Dr. Palhinha.
Vez por outra, encontrava um de seus incontáveis fãs. Todos queriam tirar fotos (selfies) com ela. Como dama educada que era, deixava-se fotografar sorridente e, claro, sempre brindava os fãs com atenção e paciência…como convém a alguém como a Alta Cultura, claro.
Mas o melhor momento do final de semana era quando se encontrava com sua irmã, que morava lá em Vila Carrão, a Baixa Cultura. Almoço aos domingos, este era o momento em que as duas trocavam ideias sobre a semana. O ritual começara quando ainda eram universitárias e, mesmo com a morte dos pais, nunca fora interrompido.
A Baixa Cultura sempre desembarcava na Trianon-Masp, onde encontrava a irmã sorridente. Vez por outra passeavam pela região porque o importante do almoço não era tanto a pontualidade, mas sim a companhia uma da outra.
‘- Irmã!!!
- Irmã!!!
- Como foi a viagem?
- Ah, o metrô não estava tão cheio. Olha, eu te trouxe uns pastéis da feira!
- Adoro!!!’
Caminharam um pouco pela Paulista apreciando a diversidade de pessoas e o comércio popular sob o guarda-sol enquanto se deliciavam com os pastéis, um hábito que adquiriram na infância. Após rápida deliberação, decidiram por um modesto almoço no Mercado Municipal. Desta vez, a Baixa Cultura pagou o Uber e o guarda-sol descansou.
O mercado não estava tão lotado quanto de costume. Já com alguma fome - pastéis nem sempre são suficientes… - as irmãs escolheram o restaurante, não sem antes apreciarem os preços dos artigos em algumas lojas.
A fome, contudo, bateu. Assim, dirigiram-se ao restaurante eleito, sentaram-se e pediram água mineral com gelo. Baixa Cultura pediu uma rodelinha de limão e, como a irmã não compartilhava do gosto pela água com leve sabor de limão, pediu (e conseguiu) ficar com as duas rodelas para si.
‘- Irmã, você não sabe o que me aconteceu esta semana!
- Diga Alta!
- Ah, Baixinha. É o Van Damme. Ele começou a me seguir no Instagram e vira e mexe puxa uma conversa.
- Nossa! O ator??
- Ele mesmo! Lembra dele no Soldado Universal?
- Se lembro!
- E aquele bumbum!
- Ah, aquele bumbum…’
Enquanto as irmãs Cultura suspiravam pelo traseiro do Van Damme (dos anos 80), um discreto fã se aproximou.
‘- Oi, desculpem-me. Vocês devem estar acostumadas, olha…
- Imagina, amigo. Eu e minha irmã gostamos muito dos nossos fãs.
- Ufa - respirou aliviado o fã - Que bom. Já sabem que vou pedir um selfie, né?
- Claro.
Sorrindo todos para a câmera do celular, o ‘selfie’ foi eternizado. O fã, claro, não pôde deixar de arriscar algumas palavras.
‘- Permitem que lhes pague algo? Um café? Garçom…
- Mas senhor…
- Tudo bem, Baixa. Deixa ele. Ademais, que mal faz se nos querem bem?
- Verdade.
- As senhoras não sabem o quanto as admiro!
- O senhor é muito galanteador! - disse Alta.
- E o que nos traz de notícias, senhor….?
- Pedro. Pedro Sette, seu criado.
- Ah, deixe disto!
- Mas senhor, Pedro, o senhor dizia…
- Bem, eu estive lendo Dante e comentado sobre literatura no Instagram quando me cortei com uma tesoura e um papel…’
A agradável e breve conversa seguiu. Três cafés cariocas foram servidos o que, como se sabe, é a regra universal de extensão de agradáveis breves conversas quando, claro, a elas se adicionam bom conteúdo e uma pitada de cortesia (e cafés cariocas).
Por mais ou menos cinco minutos durou a animada conversa até que Pedro, educadamente, despediu-se das irmãs Cultura, não sem antes deixar-lhes seu cartão com seu endereço no Instagram.
‘- Não vou me esquecer deste momento com as irmãs Cultura…
- Bondade sua, Pedro! Mande-nos mensagem!
- Pode deixar!
Partindo Pedro, as irmãs trocaram impressões sobre ele.
- Moço simpático, né, Baixa?
- Muito, Alta!’
- Mas não é o Van Damme!
- Não mesmo…
Como o garçom já parecesse ansioso, rondando a mesa como um urubu em torno da carniça, as irmãs Cultura pediram algo qualquer do cardápio e voltaram, animadamente, à conversa.
‘- Pois então, Baixa. Nunca sei…este Instagram, sabe? Tenho publicado por lá. Agora tô na fase dos autores russos.
- Ah, eu publico pouco naquilo lá. Da última vez, acho que foi sobre uns discos de brega.
- Adoro, irmã. Já ouvi vários.
- É, lembra daqueles LPs da mamãe?
- Como esquecer? Reginaldo Rossi…
- Sim, e as sinfonias de Beethoven do papai também não eram de se jogar fora.
- Verdade!
- Sabe, Alta, eu fico me perguntando se o Instagram sobreviverá. Este menino, Pedro, pelo visto, tem uns ‘stories’ bem legais lá. Mas será que podemos chamar os ‘stories’ de alta ou de baixa cultura?
- Hum, não sei, Baixinha querida. Acho que, em uns 10 anos, ninguém mais vai se lembrar do Instagram. Talvez nem exista mais como fonte relevante de informação.
- É, este mundo muda muito rápido…espero que o Pedro não seja esquecido.
- Quem paga um café para as irmãs Cultura não será jamais esquecido, Baixa!’
E riram alegremente com a piada recém-inventada.
Já que falamos nos pais das irmãs, vem-me à memória que Alta e Baixa nunca se esqueceram das lições que aprenderam com eles. Uma delas era: não se compare aos outros. Seja você mesma. Ou ainda: quando alguém lhe oferecer a amizade, e se este alguém for uma pessoa boa, considere retribuí-la.
Com estas lições transformadas em hábitos de vida, não é de se estranhar que a experiência de uma pessoa com qualquer das irmãs Cultura raramente fosse desagradável.
Pois bem. Seus estômagos não mais reclamavam e, com o fim do almoço dominical, veio a preguiça, mãe do sono da tarde. Pagaram a conta, deixando uma gorjeta (ligeiramente maior do que os tradicionais 10%) para o garçom e partiram.
Muitos irmãos ou irmãs não têm a conexão sincera entre irmãos como a de Alta e Baixa. Nunca entendi isto, mesmo sendo o autor deste texto. Queria dizer algo como ‘acima de tudo, são irmãs ligadas pela Cultura’. A frase é até bonita, mas talvez só se aplique a estas irmãs porque, no que percebo, cultura não é, necessariamente, um determinante da amizade fraternal entre irmãos. É algo mais. Amor?
De todo modo, eis uma dica: encontrar as irmãs Cultura na Paulista é uma oportunidade de se ter uma boa conversa. Domingo, aliás, é um dia propício. É só olhar à sua volta. Tenho certeza de que vai encontrá-las em meio à paisagem de concreto e indivíduos que se colorem mutuamente na bela avenida.
Dica de R - O mesmo pessoal que mencionei em um número anterior tem um excelentemente didático tutorial para se fazer um teste ADF (Augmented Dickey-Fuller) para raízes unitárias em R. O melhor: alguém fez uma função que facilita a interpretação dos testes ADF. Da mesma fonte, aqui.
Identitários na sinuca - Eli Vieira e Ágata Cahilli criticam o identitarismo radical e, quando publico esta, já colocaram no ar o segundo episódio (que ainda não assisti).
John Woo - ‘Heroes Shed No Tears’ é um filme que não é parte da série de filmes de gangsters de John Woo. Salvo engano, só este e Bullet In The Head são filmes nos quais Woo aborda a guerra (ok, tem o que ele fez em Hollywood, Windtalkers, mas eu penso mais na época de ouro dele, ou seja, anos 80, em Hong Kong).
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Doutor Palinha - O Salisburia escreveu um ótimo conto com o nosso herói, o doutor Palhinha (ou com um antepassado dele, como frisou o Alexandre Soares Silva, criador do maior investigador de todos os tempos). Aliás, o restante da newsletter do Salisburia está muito bom também. Assine!
O problema do mal? - A reflexão original do Alexandre (@LordAss) é perfeita.
![Twitter avatar for @eliasmaia_](https://substackcdn.com/image/twitter_name/w_96/eliasmaia_.jpg)
Há até umas situações irônicas. Imagine uma pessoa destas que passa por grande sofrimento encontrando outra a quem sempre recorre quando precisa de dinheiro. Discordam em alguma opinião - pode ser quem seria o campeão da Libertadores - e a pessoa sofredora se queixa com um grupo de torcedores do mesmo time - que, aliás, nunca lhe ajudaram com um mísero tostão.
Claro, é aplaudida pelos torcedores - que ainda não lhe deram um mísero tostão desde o último parágrafo, porque, sabe como é, ‘a vida é difícil para mim, que não sou rico, o importante é arrancar de alguém que tenha trabalhado muito’.
De fora, já que torço por outro time, eu ficaria só observando e pensando: puuttz, tem gente que nega o amor sem nunca ter feito um sacrifício para o próximo.
Acho que não é só o futebol ‘que tem destas coisas’.
Humor Econômico - Ok, sei que sou sem-graça. Mas como há gosto para tudo, confira minhas paródias e produções originais de piadas que só quem é da área entende.
Juó Bananére é candidato sério - Pessoas pronunciam seu santo nome em vão! Outro dia foi num episódio de Fitas, Bolachas e Catataus. Em suas bocas esfregarei sabão! Meu candidato mandou um recado seríssimo a respeito! Aliás, #juobananerepresidente.
Talvez você seja novo por estas bandas. Rapidamente: publico duas vezes por semana, geralmente às quartas e sábados. Eventualmente há algumas edições extraordinárias. Assinar (custo = R$ 0.00 + valor do seu tempo para apertar o botão subscribe com seu endereço de e-mail lá…) me ajuda bastante. A temática? De tudo um pouco. Confira os números anteriores aqui.