Sobre as aventuras espaciais do Yamato e o Pesadelo Alexandrino
Para os fãs deste clássico desenho um breve resumo seguido de um episódio imaginário de 'Twilight Zone'.
Eis o v(1), n(52) da newsletter. Conversando com o Orlando Tosetto semana passada, descobrimos afinidades comuns. Uma delas, claro, o desenho do encouraçado espacial Yamato, tema do primeiro texto. Após o intervalo voltamos com um pequeno ensaio de roteiro de um episódio imaginário de Twilight Zone feito em homenagem a um certo escritor paulista.
Talvez você seja novo por estas bandas. Rapidamente: publico duas vezes por semana, geralmente às quartas e sábados. Eventualmente há algumas edições extraordinárias. Assinar (custo = R$ 0.00) me ajuda bastante. A temática? De tudo um pouco. Confira os números anteriores aqui.
Vamos lá?
Yamato - Inspirado no maior encouraçado (couraçado) do mundo, o Yamato, afundado ao final da Guerra do Pacífico próximo à Okinawa, o anime conhecido no Brasil como Star Blazers ou Patrulha Estelar (saudosa Rede Manchete…) chegou até nós por meio de sua segunda temporada original, aquela em que o temível Cometa Império tenta escravizar a turminha do planeta azul mais simpático do Sistema Solar.
O desenho teve três temporadas (a primeira nunca passou por aqui, a despeito de boatos) e alguns longas (nenhum passou em nossa TV aberta ou paga). Foi um sucesso no Japão e, claro, também fez a alegria de muito menino por aqui (sim, sou um destes fãs da série).
O canal Coleção em Ação Show, a despeito da pronúncia incorreta de vários nomes em japonês, tem dois ótimos vídeos sobre a saga. Há o História Original da Patrulha Estelar! e Patrulha Estelar - Curiosidades e Bastidores!.
Em resumo bem rápido, a história se inicia com a Terra sendo atacada por bombas radioativas vindas do espaço, de um povo inimigo, os gamilons. O governo da Terra ressuscita o encouraçado Yamato como uma nave espacial com tecnologia superior às de suas naves, trazida de outro planeta alienígena, o distante Iscandar.
A tripulação, com seus conhecidos personagens: Sussumu Kodai, Capitão Jyuuzo Okita, Daisuke Shima, Yuki Mori (a única mulher a bordo), o robô Analyzer e mais uns tantos parte em busca de prometida tecnologia que salvará a Terra da radiação. Seu grande inimigo é Lorde Dessler, chefe supremo dos gamilons que, futuramente, irá se tornar amigo dos terráqueos.
Para os que assistiram ao Tora, Tora, Tora no cinema (como eu) ou na TV, vale lembrar que Toshio Masuda, o mesmo que dirigiu as cenas de guerra que os americanos incorporaram em seu filme, é quem dirigiu as cenas de batalha da primeira temporada. Aliás, uma interpretação comum é que a batalha final entre o General Domel e o Capitão Jyuuzo Okita seria uma releitura da batalha de Midway.
A segunda temporada é a que introduziu o desenho no Brasil. Desta vez, o inimigo é o Cometa Império comandado pelo cruel imperador Zodar (ou Zordar). Pense numa Estrela da Morte exponencialmente aumentada. Este era o Cometa Império. O final desta temporada é trágico.
A última temporada, que teve menos episódios que o previsto - um sintoma da falta de dinheiro que começava a atrapalhar a franquia - era sobre uma guerra entre o povo galman-gamilon e o Império Bolar (que apareceu em um longa metragem produzido entre as duas temporadas).
Desta guerra espacial, um míssil se perdeu e atingiu nosso Sol que começou a se expandir, ameaçando a vida no Sistema Solar. Não é difícil imaginar qual é a missão dos tripulantes do encouraçado espacial Yamato.
Um ponto que me deixa sempre intrigado é a questão do trabalho conjunto entre Reiji Matsumoto (alguns usam “Leiji Matsumoto”, a despeito da ausência da letra “L” em japonês) e Yoshinobu Nishizaki. A série funcionou bem quando trabalharam juntos. Após o fim da série, nenhum deles produziu algo tão influente (é o que eu acho, claro). Falei sobre o tema (em um ensaio parecido com este) aqui.
Matsumoto, que é um profissional do mangá, com várias obras famosas (Galaxy Express 999, Space Pirate Harlock, etc) claramente contribuiu bastante com o desenho de naves espaciais e personagens da série.
Já Nishizaki, que havia trabalhado previamente para Osamu Tezuka (o pai da animação moderna japonesa), cumpriu perfil mais gerencial, sendo ocasionalmente mencionado como um sujeito desagradavelmente exigente. Sim, ele também criou alguns desenhos, mas nada que seja lembrado como um clássico1.
Após o último longa da série, o Final Yamato (um filme algo lento, mas muito bonito e, claro, trágico), Nishizaki tentaria, sem a parceria com Matsumoto, lançar uma série OVA na época do nascente mercado de disc lasers em formato LP, a inacabada Yamato 2520.
Como faliu em meio ao empreendimento, a série nunca foi terminada2. Além disso, por outros motivos, Nishizaki passou um tempo na cadeia, o que o impediu de seguir em frente com eventuais ideias que tivesse para a franquia. Houve ainda a longa batalha judicial com Matsumoto que impediu uma eventual continuidade da série por muitos anos.
Neste meio tempo, inclusive, Matsumoto fez seu Dai Yamato Zero Go que, honestamente, é muito chato, a despeito do design lindo do gigantesco novo Yamato. Na prévia do lançamento, pela internet, ouvia-se nova letra com a mesma música tema do Yamato, algo que desapareceu, creio, por conta da mencionada disputa legal3.
Em 2009, após a resolução do imbróglio, Nishizaki lançou o que seria a continuação da saga original, o Yamato Ressurrection. Sobre este filme, uma curiosidade: ele saiu com dois finais diferentes (um deles chamado de director’s cut), ambos deixando uma clara chamada para a continuação.
Um ano depois, ao invés da esperada continuação, Nishizaki lançou o live action, com o famoso cantor e ator Tatsuya Kimura e efeitos parecidos com os usados na série Battlestar Galactica. Infelizmente, Nishizaki faleceria logo após o lançamento do filme e nada mais se disse sobre a continuação do filme de 2009.
A partir de 2012, sob a produção executiva do filho adotivo de Nishizaki, inicia-se a releitura da série clássica que inclui novos personagens e altera vários elementos das história original. Esta releitura continua até hoje (no momento, a produção gira em torno da releitura do filme de 1979, Yamato - The New Voyage.
Finalizando, sobre o Yamato, o mais enciclopédico site é o Our Star Blazers. Sobre Leiji Matsumoto não achei um site mais completo, mas o Leijiverse é uma boa referência.
p.s. Orlando Tosetto me falou da série e de como ele gostava da música tema (ele foi o motivo deste texto). Esta música é um clássico de todo karaokê. Cantada originalmente por Issao Sassaki (que foi um atuante cantor de temas de animes e que ainda está vivo), você pode encontrá-la em vários vídeos no YouTube. Eis um deles (note o visual Elvis Presley do Sassaki…).
A abertura da primeira série (a que não passou aqui) está aqui. A da segunda temporada está aqui. A que os brasileiros se recordam é esta, em inglês.
Ano passado, com a situação conturbada em que (ainda) vivemos, pensei muito sobre esta ‘space opera’ e, bem, em complemento a este texto, minha opinião sobre o significado do Yamato no período da pandemia pode ser encontrada aqui.
Pesadelo Alexandrino (roteiro para um episódio de Twilight Zone) - Alexandre SS chegou à Livraria do Travesso, localizada em belíssimo casarão moderno, com paredes de vidro exibindo, orgulhosamente, pilhas e pilhas de livros cercadas de belas agendas, cadernos, canetas e, claro, sacolas de pano com mensagens politicamente corretas.
Cautelosamente, colocou a cabeça para dentro da porta principal e notou que havia um efeito estranho: a despeito de ser dia e das paredes de vidro, a luz do dia não entrava no interior da livraria. Curioso, entrou.
Subitamente, foi acometido de um desejo inabalável de procurar livros de Fernanda Montenegro. Sem conseguir se controlar, invadiu a seção de literatura como um louco. Olhava alucinado para as estantes e gesticulava como um louco. Diversos livros de Machado de Assis, José de Alencar, Carlos Drummond de Andrade e até de Mário de Andrade eram arremessados ao ar.
Curiosamente, ele não parecia notar os livros de Rubem Fonseca, motivo pelo qual eram os únicos a permanecerem e.xa.ta.men.te em seus lugares. Mais estranho ainda, os vendedores não pareciam notar a bagunça que ocorria4.
Sem achar exemplares de livros montenegrinos (embora alguns autores simpatizantes do montenegrismo pudessem estar escondidos entre um guia de receitas ou um manual de auto-ajuda), sentia sua mente queimar, o que o deixava mais furioso.
Não apenas jogava livros ao ar como também passou a rasgar alguns. Não só de literatura, mas também de culinária, saúde, esportes e até dicionários eram vítimas de sua recém-adquirida fúria livrocida.
‘- Onde estão os livros de Fernanda Montenegro! Fogo! Fogo! Marimbondos de Fogo! Marimbondos de Fogo!’
Como se respondessem aos seus gritos, marimbondos em chamas surgiram por detrás das estantes de livros da seção de pedagogia. Um assustado Alexandre SS viu-se rodeado por eles, o que adicionava calor externo à sensação de queimação mental. O desespero alcançava níveis extremos quando, de repente, toda a livraria virou pó (exceto, claro, pelos livros de Rubem Fonseca, que permaneciam flutuando em seus lugares originais).
Os marimbondos desapareceram e, com eles, a sensação de queimação. Os atendentes pareciam indiferentes a tudo aquilo e continuavam trabalhando manuseando objetos invisíveis. Uma incrível sensação de paz inundou a mente de Alexandre SS que se acalmou e quase comprou um livro invisível, mas desistiu porque, sabe como é, livros estão caros.
‘- O senhor tá bem?’
Surgira, assim, do nada, ao lado de Alexandre SS, o famoso Groucho Marx.
‘- Acho que sim. O que faz aqui, Sr. Marx?’
’- Ah, pode me chamar de Groucho. Eu estava passando aqui procurando um charuto e vi o senhor aqui, no meio deste pó todo.’
’ - Estranho, eu não me lembro. Mas acho que vou para casa.’
’- O senhor não quer me ajudar a encontrar um bom charuto?’
’- Pode ser, pode ser.’
’- Acho que este é o início de uma grande amizade, seu Alexandre SS’.
’ - O senhor sabe, sou grouchomarxista e…’
De repente, Alexandre SS acordou. Assustado e suando, notou que tudo havia sido apenas um pesadelo. Foi então que ligou a televisão e notou que a Academia Brasileira de Letras tinha notícias bem apavorantes…
A Poderosa Ísis - Talvez o seriado com os roteiros mais bobos para uma super-heroína, mas o visual de Joanna Cameron convencia. Aliás, houve um desenho da Filmation com uma liga de super-heróis (Freedom Force, não me lembro o nome disso no Brasil) que a incluiu. RIP, Joanna Cameron.
![Twitter avatar for @DavesComicHero](https://substackcdn.com/image/twitter_name/w_96/DavesComicHero.jpg)
![Image](https://substackcdn.com/image/fetch/w_600,c_limit,f_auto,q_auto:good,fl_progressive:steep/https%3A%2F%2Fpbs.substack.com%2Fmedia%2FFCewlKxX0AYXlyt.jpg)
Cheers! - Sem dúvida, uma das músicas-temas mais simpáticas da televisão. Vencedor em uma votação recente no Twitter, creio.
Governança Radical - Um mapeamento mundial de zonas econômicas especiais.
Apontamentos da Paulicéia - Estivemos por São Paulo semana passada. Posso ou não ter encontrado alguns conspiradores newsletteiros. Vou deixar o mistério no ar. Não tiramos fotos (confesso que tive vontade, mas seria muita tietagem5). Na ocasião que, repito, pode ou não ter ocorrido (ou posso estar delirando), teríamos almoçado e eu, como bom mineiro, tentei falar mal de todos os ausentes.
No dia em que chegamos a São Paulo, uma tia ‘torta’ faleceu. Sofria muito a minha tia e, com certeza, descansou e está em algum lugar melhor. Alguns dos primos se reuniam em sua casa enquanto ela mesma ia comemorar com os parentes do seu marido, não sem antes nos deixar doces maravilhosos (nos últimos anos ela ganhava a vida confeitando bolos, biscoitos e outros itens similares). Ela gostava de escrever contos. Fica este número dedicado à sua memória.
Por hoje é só. Espero que fique bem e a gente se vê no sábado. Caso queira assinar ou compartilhar, agradeço muito. Ajude-me a levar as palavras aos que delas precisam. ^_^
Um deles, o porta-aviões Blue Noah, parece ter sido legal (não passou por aqui). O mesmo aparece, no início do último filme da saga clássica, o Yamato Ressurrection, de 2009, num crossover até meio simbólico. Mas não pense que só Nishizaki gostava de auto-citação. Na inacabada saga em quadrinhos do Yamato de Matsumoto, ainda nos anos 70, em pleno sucesso da série na TV japonesa, ele inclui o Capitão Harlock num curto trecho, insinuando que, na verdade, o famoso pirata seria o irmão desaparecido de Sussumu Kodai (o personagem central da série da série, aqui conhecido como Derek Wildstar).
Antes que eu me esqueça, há quem venda praticamente todas as séries e filmes do Yamato no Mercado Livre…
Creio que foi a última participação do grande maestro e compositor Hiroshi Miyagawa para a série. Ele morreria um tempo depois e, curiosamente, seu filho, Akira Miyagawa, é o responsável pela trilha na releitura da série.
Isso me lembra um episódio em que, ainda jovem, estagiário na biblioteca do antigo Instituto Goethe, tentava salvar livros de uma chuva torrencial enquanto um casal de namorados parecia me ignorar de forma absoluta (ou seu amor era tão profundo…). Um dia eu conto esta história.
Em compensação, no vôo da volta, consegui uma foto com o mito. Claro, falo do goleiro Fábio, do glorioso Cruzeiro Esporte Clube.