O efeito Peltzman dos árbitros de futebol, o número de associações de pesquisa em Economia, Public Choice etc
O árbitro de vídeo virou um substituto dos juízes? Há poucas associações de pesquisa em Economia no Brasil? Eram os Deuses astronautas? (Ok, exagerei)
Bom dia. Você está entrando em uma dimensão além do tempo e do espaço, uma dimensão de textos estranhos, exóticos, que podem causar vertigem e pânico. Textos do v(1), n(42) desta newsletter…além…da imaginação.
(Novamente, por motivos alheios à minha ordeira vontade, publico com um dia de antecedência. A próxima, prometo, é no sábado)
Você talvez seja novo por estas bandas. Então, rapidamente: publico duas vezes por semana, geralmente às quartas e sábados. Eventualmente há algumas edições extraordinárias. Assinar (custo = R$ 0.00) me ajuda bastante. A temática? De tudo um pouco. Confira os números anteriores aqui.
Efeito Peltzman no Futebol - Em 1975, o economista Sam Peltzman publicou um artigo dizendo que regulações que pretendiam aumentar a segurança no trânsito não teriam cumprido seu objetivo.
Acho que foi Steven Landsburg, outro economista, que fez a arguta observação: se você quer mais segurança no trânsito, coloque uma faca no volante, com a ponta apontada para o motorista. Assim, ele dificilmente vai se colocar em situações que deva frear bruscamente.
O efeito Peltzman tem sido discutido não só nas questões de regulação do trânsito. Na área conhecida como Economia dos Esportes (Sports Economics), há evidências do efeito, por exemplo, no caso das proteções para jogadores de hóquei. Mas não são apenas jogadores que podem ter seu comportamento alterado por conta de novas regras.
Em tela, o caso da arbitragem no futebol brasileiro. Recente e gradualmente, a CBF tem implantado o chamado árbitro de vídeo (VAR- video assistant referee) em seus principais campeonatos e, a despeito dos treinamentos e período inicial de adaptação, observa-se uma queixa generalizada dos clubes sobre o que deveria ter sido melhorado: o desempenho dos juízes.
É óbvio que há muita queixa para torcedor ver, mas há um ponto válido e comum a várias das reclamações, qual seja, o de que os árbitros estariam escorando-se no VAR, deixando de observar infrações óbvias no campo o que é, basicamente, o efeito Peltzman. Note que este tipo de comportamento estaria sendo observado, inclusive, em jogos sem público.
Não encontrei estudos que testem a hipótese do efeito Peltzman para esportes com foco no comportamento dos juízes (e imagino que os dados não sejam tão fáceis de se conseguir). Talvez, no futuro, tenhamos alguma pesquisa sobre o tema.
Conhece algum estudo sobre o Efeito Peltzman no futebol? Comente aqui.
Por que tão poucas? - Falando em Economia, quando você olha a lista de associações de pesquisa em economia nos EUA (quase todas participam, geralmente, do encontro anual da American Economic Association) e compara com o que vê no Brasil, o que pensa?
É, você provavelmente pensou que não há quase nada por aqui. Acho que há problemas de oferta e de procura (demanda).
Alguém me disse - não tenho a citação - que o fato de, no Brasil, haver um número escasso de associações de pesquisa com interesses específicos dentro da Economia, teria a ver com o tamanho absurdamente menor da comunidade em relação à dos EUA.
Não posso discordar deste argumento. De fato, a despeito da maior internacionalização da profissão nos últimos anos, do boom do ensino privado e mesmo do aumento do mercado para economistas (que, chuto, aumentou e se diversificou após o sucesso do Plano Real), ainda há poucas associações de economistas por aqui. A demanda por algo mais especializado, assim, ainda seria baixa.
Do lado da oferta, bem, não conheço a legislação dos EUA, mas me pego pensando se não há um bocado de regras burocráticas (e tributárias) que tornem difícil, no Brasil, o surgimento de associações similares. Muito provavelmente, um efeito (indireto?) desta visão sindical-corporativista implantada por Vargas (e ainda amada por muitos).
Uma listagem não-exaustiva de associações de economistas (apenas as que encontrei com explícita menção à data de fundação em seu respectivo site) encontra-se a seguir1:
SOBER (1959), ANPEC (1973), ABEP (1977), SBE (1979), ANPUR (1983), ABrES (1989), ABET (1989), ECOECO (1992), ABPHE (1993), SEP (1996), SBFIN (2001), ABDE (2007).
Esta lista, ainda que incompleta, dá uma dica da evolução da história econômica brasileira naquela perspectiva de Adam Smith de que a especialização é função da extensão dos mercados.
Não coincidentemente, inicia-se com a economia agrícola (SOBER)2, passa pela consolidação inicial da profissão nos anos 70 (ANPEC) e o advento dos métodos quantitativos (SBE) no final da mesma década.
A seguir, nos anos 80, começam a surgir novos ramos: economia urbana (ANPUR), da saúde (ABrES) e do trabalho (ABET). A tendência segue nos anos 90 com a ecologia (ECOECO), a história econômica (ABPHE) e a economia política, predominantemente de corte heterodoxo (SEP).
Nesta minha lista preliminar há uma pausa no período da estabilização econômica. Depois do Plano Real em 1994 e da implantação do sistema de metas de inflação em 1999 surge, em 2001, a associação de estudos em finanças (SBFIN). A mais recente, no final da minha lista, é a de law and economics (aqui chamada de Análise Econômica do Direito), fundada em 2007.
Não sei você, mas acho curtinha esta lista, comparativamente ao que vejo nos EUA. Talvez os EUA não sejam um bom parâmetro, mas é a referência científica sobre Ciência Econômica desde o pós-guerra.
A mudança de ares é belissimamente descrita pelo falecido Hans Brems em seu Pioneering Economic Theory, 1630-1980 - A mathematical restatement, The John Hopkins University Press, 1986:
A century after its political independence the New World declared its intellectual independence, and the muse of economics left Europe for the first time. At first she dwelt on a serene campus in New Haven; then on Manhattan and at either end of Massachusetts Avenue in another Cambridge. She liked America and went farther afield, to the drab Chicago South Side and all the way to the West Coast. She even crossed the Pacifit and paid her visits to a new industrial giant. [Brems (1986), p.1]
Sigo pensando na pergunta inicial. Ainda acho que são poucas as nossas associações…
Esqueci sua associação? Faltou algo? Deixe seu comentário aqui que eu leio.
O Paradoxo de Simpson… - Uma forma divertida de entender o Paradoxo de Simpson.
O que é o Paradoxo de Simpson?
Suponha que um diagrama de dispersão simples mostre uma correlação positiva entre níveis de colesterol e tempo de prática de exercício(s). Isso significa que fazer exercícios aumenta seu colesterol?
A conclusão apressada é positiva, mas ignora uma informação importante, coletada, mas que não está no gráfico: a idade dos entrevistados. Guilherme Jardim Duarte explica.
Na verdade, o que está ocorrendo é que a idade das pessoas entrevistadas está ao mesmo tempo impactando a quantidade de exercícios e a quantidade de colesterol no corpo. Assim, quando isso ocorre, estamos diante de variáveis confusoras (ou confounding variables em inglês). Esses tipos de exemplos são geralmente conhecidos na literatura como paradoxo de Simpson e são muito comuns. [Guilherme Jardim Duarte, “Causalidade” em Guia Brasileiro de Análise de Dados, p.24]
O mais interessante sobre o paradoxo: seu exemplo mais famoso, aquele do suposto viés contra as mulheres na admissão de alunos na UC Berkeley, nunca gerou um processo na justiça, como muitos afirmam.
Public Choice e o Brasil - Sei que sou repetitivo no tema, mas o prof. Jorge Vianna Monteiro fez o melhor comentário sobre o problema da endogeneidade do arcabouço institucional brasileiro que alguém poderia ter feito. Diante de uma entrevista de Pérsio Arida, ele, muito cirurgicamente, escreveu:
O economista Pérsio Arida merece uma forte qualificação à sua entrevista dada ao O Globo de hoje (16/9/21, página 17). Diz ele ser contra a uma “constante expansão” que ocorre em nossas regras constitucionais. Ora, ora! O Plano Real recorreu maciçamente à deterioração do sistema constitucional da separação de Poderes: pilar de nossa democracia representativa presidencialista. Em decorrência, o sucesso dessa política anti-inflacionária deveu-se à uma elevada e sustentada transferência do poder de legislar do Congresso Nacional para a alta gerência do Executivo Federal. Ou ainda: dos detentores de mandato eletivo para meros burocratas. Se o leitor precisar ser convencido dessa fundamental *âncora institucional* - mãe de todas as âncoras do Plano Real - veja números, gráficos e análise de public choice desse peculiar *Estado administrativo* que se instalou na economia brasileira nos anos 1990, que pode ter gerado um - até aqui inestimado - *custo social*, em J.V.Monteiro, “As Regras do Jogo: O Plano Real, 1997-2000”, FGV Editora, 2000.
O ponto central de seu argumento é que várias análises de conjuntura e artigos de opinião insistem numa visão totalmente inadequada do arcabouço sob o qual se dão as escolhas públicas (as dos burocratas, políticos, juízes, policy makers etc).
Como ele bem destaca, o sucesso do Plano Real veio com um custo claro: uma transferência do poder de legislar dos eleitos para os não-eleitos. Isso é bom? Isso é ruim? Não sei. Mas de uma coisa eu certamente sei: analisar a conjuntura econômica sem considerar este aspecto é ser muito ingênuo.
Ah sim, a Public Choice parece estar se tornando mais popular na Europa (artigo aberto).
Anne Frank seria cancelada no Brasil de hoje - Não tenho dúvidas. A reflexão do Alexandre Soares Silva não é só um bom texto. É um alerta (texto aberto só para assinantes da revista). Aliás, isto não é bem ficção, para minha tristeza.
Educação é só sinalização? - Caplan diz que os dados apontam nesta direção em seu famoso livro (acho que já mencionei aqui). Mas o mais engraçado é esta peça de teatro de um amigo dele, sobre o tema.
Humor mineiro - o pernambucano que se tornou mineiro e faz repetidas piadas de mineiro ‘ataca’ os paulistas…e ficou muito bom.
Por hoje é só. Até a próxima. Fico agradecido se puder compartilhar o conteúdo com seus amigos.
Ou mesmo, em um acesso de loucura, se decidir assinar…
Sem links ou detalhamento das siglas. Dá muito trabalho e sai mais barato você colocar no google. Sem falar da minha preguiça.
Quem não se lembra das antigas controvérsias sobre a (in)elasticidade da oferta de produtos agrícolas? Affonso C. Pastore tratou do tema em A Resposta da Produção Agrícola aos Preços no Brasil, São Paulo, APEC, 1973. Há também o clássico de Fernando Holanda Barbosa, A Inflação no Pós-Guerra: Monetarismo versus Estruturalismo, do IPEA/PNPE, de 1983, que passa pela mesma discussão.