Mas vocês não estão prontos para esta conversa - Nosso homem em Havana - Olavo Bilac demitiu Juó Bananére - Outros.
"Cor contrictus et humiliatus nee Deus epiciat" ("Gôro gurtido i mogliato ne Deus espixa", segundo Bananére)
Eis o v(2), n(92) da newsletter. Fiz uma enquete, mas que recebeu poucos votos, sobre a frequência desta (se uma ou duas vezes na semana). Vou pensar no assunto (comentários são bem-vindos).
Mas vocês não estão prontos… - Teresa era uma daquelas que os norte-americanos chamam de opinable person. Tinha opinião sobre tudo e todos. Inclusive sobre como você (e eu) deveria (deveríamos) tocar a sua (nossa) vida (vidas). Não era lá uma pessoa muito estudada, mas estava em todas as reuniões do partido, de onde, inclusive, tirava material para seus disparates e provocações.
Conheci Teresa em uma destas reuniões de amigos em que os mesmos trazem alguns novos amigos. Sempre é bom conhecer novas pessoas, mesmos que seja para não mais conversar com elas. Pelo menos, é o que pensava, na época.
Estávamos eu e uns amigos na varanda do grande apartamento de Leôncio, um juiz federal, falando sobre temas diversos quando fomos apresentados à Teresa. Falávamos sobre futebol, ou algo similar, quando ela disparou:
‘- Os jogadores de futebol? Ganham muito mais que o restante da população (nesta hora, Leôncio olhou feio para ela), mas vocês não estão prontos para esta conversa.’
Todos se entreolharam, e, em um impulso de cautela, eu e os demais apenas balançamos a cabeça, de forma neutra, nem afirmativa, nem negativa (uma técnica que desenvolvi em anos de contato com gente de opiniões fortes).
A conversa seguiu e Teresa não deixava barato. Era o tempo todo um tal de mas vocês não estão prontos para esta conversa que, inevitavelmente, a paciência chegou ao seu nível mínimo (mais ou menos como a Cantareira em tempos de seca).
‘- Este negócio de cachorro quente é muito complicado, mas vocês não estão prontos para esta conversa.
- Como assim, Teresa?, retruquei.
- Como assim? Ora, como ‘como assim’?
- Assim: por que é que não estamos prontos para esta conversa?
- Porque não.
- O que é? Não estamos vestidos adequadamente? Ou faltou um perfume? Explique melhor, Teresa!
- Ora, a conversa é muito mais complexa, é preciso um olhar plural.
- Eu tenho dois olhos!, disse um.
- Eu também! Não tá plural para você?, disse outro.
- Vocês não entendem, a questão é social, multifacetada, tem que mudar o mindset.
- Que mindset precisamos mudar? Quais as ‘multi-faces-sociais’ você considera nesta questão?
- Vocês não estão entendendo, acho que vocês não estão mesmo preparados para esta conver…
- Ah, vai ver se estamos lá na esquina, Teresa. Tenha dó!’
Apenas Teresa parecia não perceber a sua falta de consistência lógica. A conversa não durou muito. Frustrada, ela saiu com os olhos cheios d’água e com a idéia (com acento) fixa de que todos ali eram machistas, racistas, etc. Teresa havia sido treinada para jamais assumir a culpa. Isso ela aprendeu bem.
Ironicamente, ficou claro que ela é quem não parecia estar preparada para esta (ou qualquer outra) conversa. É, somente jargões não alimentam a sabedoria. Quando não…
Nosso homem em Havana - Ok, terminei o livro (e já descobri o filme nas plataformas da vida). É sensacionalmente engraçado. Não é um livro novo, obviamente. É de 1958. Além de bem escrito (você não tem preguiça de ler, pelo contrário), a trama evolui de forma inesperada.
Sim, sim. É um livro divertido. A edição da Biblioteca Azul, com tradução de Fábio Bonillo (que nos dá algumas poucas, mas muito úteis notas de rodapé) está muito boa. Encadernação flexível, resistente e com uma capa que transmite bem a premissa da trama, já que o contratado espião é um vendedor de aspiradores de pó e, por sua vez, os aspiradores têm um papel central, nuclear (ahá!) na trama.
O filme, de 1959, traz Alec Guiness no papel principal do vendedor Jim Wormwold e é fortemente baseado no livro (os diálogos são basicamente os mesmos). Pode-se dizer que é praticamente uma versão condensada do livro, apenas com um toque de humor original bem no finalzinho do filme.
Um ponto alto do livro (muito bem aproveitado no filme) é o plano de Wormwold de embebedar o capitão Segura em um jogo de damas em que as peças são garrafinhas de uísque, afim de pegar sua arma para uma vingança.
Claro, se você pensar em Public Choice (Escolha Pública), tema recorrente por aqui, a comédia de Graham Greene é um bom exemplo, para alunos de graduação em Ciência Econômica, de como a burocracia dos serviços de inteligência também é composta de indivíduos que agem conforme seus interesses pessoais. O final do livro é um belo caso a ser discutido com os alunos.
Livro e filme excelentes. Altamente recomendado.
Olavo Bilac demitiu Juó Bananére - Bem, não ele, diretamente. Mas seus fanáticos seguidores. Pelo que li em Raízes do Riso, de Elias Thomé Saliba (Companhia das Letras, 2002), por conta de uma paródia de Bananére com uma fala de Olavo Bilac, estudantes da Faculdade de Direito (os paulistas adoram seus advogados, procuradores, juízes e desembargadores, eu sei) pressionaram e conseguiram sua demissão d’O Pirralho.
Aliás, Saliba, o autor do livro, faz uma análise bem menos ufanista e efusiva da Semana da Arte Moderna de 22. Uma análise, ao meu ver, bem mais realista, ao lembrar que foi feita com patrocínio oficial do governo paulista, interessado em recuperar o prestígio político que havia perdido com a campanha civilista. O regionalismo, assim, teria um papel óbvio no discurso político.
Do outro lado, Bananére e outros - os chamados de humoristas macarrônicos por Saliba - não se comprometiam com este discurso. Em suas palavras:
(…) o humor dos humoristas macarrônicos, a despeito de sua variedade e circunstancialidade, foi, no fundo, desmobilizador, anárquico, lírico e anti-programático. [p.206]
Pena que não tenhamos tantos Bananéres hoje em dia…
Mas não era tudo relativo? - Pedro mostra o quão contraditórios são alguns bravos brigões de redes sociais…
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(*) “até mais ler” foi plagiado do Orlando Tosetto, cuja newsletter, aliás, você deveria assinar.
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