Banca de jornal - Nazismo em alta - O café - O final do ano - outros.
Theaté, Teité, Teeté, Tyethé, Tyethê, Tieté, Tietê: escolha.
O v(3), n(69) chega com estas opções de grafia para Tietê, conforme nos informou o grande Afonso de E. Taunay em Relatos Monçoeiros. (edição da Itatiaia, 1981). Notei que o próximo número será o último antes do Natal.
Os amigos, as amigas, onde estão? Não sei. Provavelmente em um lugar melhor do que o meu, por isto andam tão sumidos. Ou não. Espero que estejam todos bem e vamos ao número de hoje.
Banca de jornal - Falei sobre isto em 2021 (aqui), mas, nestes dias, eu me lembrei novamente deste curto, mas maravilhoso, período de minha vida. Fui feliz aos 11 anos (10 ou 11) trabalhando aos domingos em uma banca de jornal.
A criança que tomou gosto pela leitura por conta das histórias em quadrinhos não poderia se sentir melhor com a realização de seu sonho. Afinal, entrar em uma banca de jornais era como entrar em um mundo de possibilidades.
Para minha sorte, acho que o dono escondia, nas manhãs dominicais, as revistas proibidas para menores de 18 anos. Ou eu mesmo não me interessei por elas. Já não me lembro tão bem daqueles dias, mas sei que, sim, ali fui feliz.
p.s. O Orlando falou das bancas, das suas bancas afetivas, eu diria, aqui.
Nazismo em alta - …e com inusitado apoio de uma quinta coluna - apoio consciente ou não - de mulheres que ocupam cargos importantes em famosas universidades dos EUA.
Parece que a política ESG de maior diversidade deu certo: aumentou a diversidade ideológica. Agora, temos um antissemitismo elegante, intelectual, sofisticado no poder. Não vejo a hora de ver artigos sobre uma análise contrafactual dos Protocolos dos Sábios de Sião. Aliás, veja este ótimo trecho do
:A quick thought experiment: imagine if large numbers of students and professors had marched through the campus of Penn over the past two months saying that all black people should go back to Africa and whoever remains should be subjected to genocide. Should the president of Penn defend those people merely as exercising their rights to free speech?
(original aqui).
O experimento mental nos mostra bem que há um viés nesta hipocrisia demonstrada pelas três reitoras.
A queda do custo do uso da tecnologia (ChatGPT como exemplo máximo) faz com que qualquer um possa apresentar um relatório de pesquisa com sofisticadas técnicas de ciência de dados ou do que quer que seja. Só os valores morais é que continuam caros, necessitando de muito esforço mental para serem apre(e)ndidos.
Note que, em um mundo com liberdade de expressão socialmente (quem é o ‘social’? Ninguém sabe…) regulada, provavelmente estas opiniões abjetas poderiam sequer virem a público, impedindo-nos de saber, de fato, com quem estamos falando.
Errar é humano e perceber a bobagem que se escreve ou se diz é sempre um possível saída.
O café - Dia destes saí para uma caminhada e descobri um café em uma das - cada vez mais raras - casas do bairro. O local é amigo dos animais (inclusive dos humanos), motivo pelo qual você pode se sentar e saborear um café enquanto dois cachorros se divertem ao seu lado.
O atendimento: há um defeito. Os garçons parecem assumir que você fará o pedido e nunca mais pedirá outro item do cardápio, ou mesmo a conta. É certo que é bom que me deixem à vontade com meu café e meu eventual pão de queijo ou algum outro comestível. Só que os garçons parecem mesmo se esquecer de você.
Foi assim que, numa destas manhãs de sábado, enquanto esperava pela volta da simpática garçonete, embarquei em uma épica viagem pelo rio Tietê colonial, em um barco, vestido de bandeirante e com uma tropa de índios e colonos (alguns deles, espanhóis) em busca do sentido da vida.
Primeiro, enfrentamos Preguiças gigantes, remanescentes do primórdios do planeta. Apesar de nossos arcabuzes, foi difícil derrubar os monstros que levaram alguns dos nossos para o descanso eterno, o que não deixa de ser engraçado, já que são Preguiças.
Após a - por mim batizada - Batalha das Preguiças (a nossa contra a deles) - descobrimos uma cidade perdida de boitatás no caminho para Piracicaba. Os boitatás viviam com uma tecnologia muito à frente do seu tempo. Tinham carros voadores, foguetes e não tinham celulares, o que nos diz muito sobre a sabedoria destes seres incríveis.
Os boitatás nos acolheram, alimentaram-nos, cuidaram dos feridos e nos deram novas roupas que eram bem parecidas com os uniformes da Frota Estelar, aquela do Capitão Kirk e do Senhor Spock. Também ganhamos charutos e algumas jabuticabas para seguirmos viagem.
Após nos despedirmos, voltamos à nossa aventura. Passamos pela fonte da juventude com muito cuidado porque, depois das Preguiças, não queríamos facilitar. Onde tem Preguiça Gigante tem King Kong. Ou Godzilla. É o que dizem os sábios. De forma que prosseguimos com muita cautela.
Quando íamos alcançar algum outro local exótico, a garçonete passou perto de mim e pude lhe pedir mais um café. Apesar do alívio de poder fazer meu pedido em menos de vinte minutos adicionais, perdi completamente a linha de raciocínio anterior e não mais consegui retomar os detalhes, os fatos, enfim toda a história de minha epopeia como bandeirante.
Olhei para a rua e vi, do outro lado, uma árvore com as folhas bem verdes. Não vi nela pássaro algum, apenas folhas. Beberiquei um pouco mais do café enquanto, ao lado, dois cachorros pareciam se divertir. Não entendo tanto de cachorros como gostaria. Pensando bem, não sei se gostaria entender mais de cachorros mas, em seguida a este breve pensamento, lembrei-me que entendo os seres humanos, o que me deixa bem triste. Talvez entender um cachorro não seja assim uma ideia tão ruim.
Ainda hoje não consigo me lembrar da continuação deste meu estranho devaneio bandeirante…
O final do ano - Chegou sem que percebesse. Bem, os sinais estavam por todos os lados: a decoração de Natal nas lojas e…hum..só isso. O clima não era exatamente de festa, principalmente para ele. Do bolso da camisa tirou um charuto baiano, substituto imperfeito de um clássico cubano, e o acendeu.
Sentiu o gosto algo suave das folhas na boca e soprou para o alto. Olhava as nuvens lá fora e pensou que agora sim, tudo ficaria bem. Afinal, tudo que havia proposto fazer no ano havia sido cumprido. Não que tivesse 100% de sucesso, não. Cumpriu na medida do possível e, em alguns casos, do impossível, pois certas dores precisam se limitar ao seu dono.
Ah, fora um ano e tanto!
Pensou, por um momento, que receberia a visita dos famosos três espíritos de Natal, aqueles que te mostram o passado, o presente e o tenebroso futuro para que você possa se convencer de que vale a pena continuar vivendo (ou que vale a pena mudar seu modo de vida). Por alguns segundos fechou os olhos, na esperança de que eles viessem, mas nada. Ninguém viria para lhe dizer algo sobre sua vida ou seu comportamento.
Segunda baforada e rabiscou algo incompreensível em seu caderno de anotações. Pensou que talvez fosse uma boa idéia (com acento!) fazer um balanço geral de sua vida naquele ano. Talvez fosse uma boa mesmo. Substituiria os três espíritos, não?
Na primeira página escreveu algo como: meu passado foi bem vivido. Mais boas recordações que ruins. Podia ter me declarado para Laurinha aos 11 anos. Sacudiu a caneta-tinteiro e desenhou o que parecia ser, dentro de seu limitado talento artístico, uma árvore com um cachorro urinando. Sorriu.
Terceira baforada e resolveu fazer um café. Enquanto a água fervia, voltou ao caderno. Desta feita, demorou um pouco. Afinal, era o presente. Ano ruim. Fiz o que tinha que fazer e quase tudo que me pediram. Faltou aquela viagem para algum lugar novo. Revi os amigos, mas não consegui manter muito contato com eles. Calor do inferno!
Borrou a última frase com a tinta. Maldita caneta! Quem mandou ser canhoto, né? Fez um risco que, supostamente seria reto, e se preparou para a última e derradeira visita ao futuro incerto. No fogão, a água borbulhava, causando algum ruído. Levantou-se e desligou a chama. Preparou o café e voltou para sua mesa com a xícara de cerâmica cheia. Era chegada a hora do ‘Espírito do Natal Futuro’.
Como lidar com o futuro? Não conseguia pensar em nada. Projetar o passado e o presente no futuro não parecia ser uma boa estratégia, pois isto transformaria o futuro em mera extensão do que já foi e do que é. Olhou para a janela e notou que o sol ainda estava coberto por nuvens, aliviando um pouco o calor. O charuto já se aproximava da metade e teve que reacendê-lo.
As nuvens não o permitiam ver o sol, ou o futuro. O único jeito de ver o futuro seria estar lá? Isto sem falar que o futuro pode ser múltiplo e saber qual deles é o mais provável pode não ser trivial, ou apenas o resultado de um palpite inconsequente.
O café estava no fim. A fumaça do charuto na baforada seguinte foi mais densa. No caderno, a caneta não se mexia. Talvez não houvesse futuro a ser pensado ou vivido. Reparou novamente na visão da janela e percebeu que mais nuvens brancas ocupavam o céu. Parecia mesmo que seu apartamento estava, todo ele, cercado por elas. O futuro, subitamente, não parecia tão importante assim.
Com a derradeira baforada, fechou o caderno e notou que o mesmo flutuava, junto com a mesa, a xícara, o café, a caneta e tudo o mais. Sentiu um aperto agudo no coração, mas sorriu. Pensou em todos os seus amigos, fechou os olhos, deitou a cabeça sobre a mesa e sorriu. Foi seu Natal mais feliz em anos.
Badé - A última crônica do
está ótima. Leia-a aqui.Imprensa - Foi um prazer fazer parte desta matéria da Gazeta do Povo.
Digo… - Digo…às vezes é preciso se lançar em águas desconhecidas. Às vezes não. E tudo isso é uma baita filosofada barata, hein?
Por hoje é só, pessoal e…até mais ler! (*)
(*) “até mais ler” foi plagiado do Orlando Tosetto, cuja newsletter, aliás, você deveria assinar.
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Anda melancólico....