Aquele que o abismo viu e seu nome (o do abismo) era Brasil.
Porque até Gilgámesh pode dar o azar de nascer aqui.
Eis o v(2) n(16) desta newsletter. Sem muito tempo nestes dias porque o dever consumiu boa parte das energias deste aqui.
Ucrânia - É, o mundo anda meio cambaleante. Parece que outro dia bebeu muito e tropeçou, caindo de Ucrânia no chão. Dizem que quebrou de tal forma que nem gesso ajuda. O médico do SUS, tal de Vladimir, pareceu ser um residente inexperiente, mas muito assertivo.
O mundo não parece ter recebido os devidos cuidados. Não sei, mas creio que ficará com problemas por um bom tempo. Pior, não é fácil provar, na Justiça, que houve erro médico…
Gilgámesh - Finalmente comprei o Epopéia de Gilgámesh - ele que o abismo viu. A tradução comentada é de Jacyntho Lins Brandão e a editora é a Autêntica. Saiu por aqui em 2017. Eu já havia ouvido falar da epopéia, mas nunca havia lido o poema que, dizem os especialistas, é o ‘mais antigo registro literário’ que temos.
Ainda estou no meio da epopéia mas, pelo visto, não demorarei a terminar. O bom desta edição é a fartura de comentários do prof. Brandão, o que torna a leitura menos enigmática, sem falar das informações históricas, inclusive acerca da própria evolução do poema.
Como dizem, realmente há muitos temas modernos que já aparecem no épico poema. Espero, no término da leitura, ter inspiração para escrever algum tipo de comentário sobre o simpático (?) Gilgámesh.
p.s. eu escrevo assim: epopéia. Dane-se o acordo.
Fãs de Putin - Não queria me repetir, mas a esquerda autoritária brasileira segue não-estudada pelos acadêmicos (alguns dos quais, acredite se quiser, fãs de Putin nas redes sociais…).
Mas já que Putin tem fãs, vamos aproveitar que o Rodrigo preparou uma thread sobre alguns feitos nada honrosos atribuídos ao líder russo.
Dá uma lida lá. No mínimo, ajuda a ponderar sobre este suposto mito que alguns adoram.
E por falar em esquerda autoritária, este estudo pioneiro nos dá elementos psicológicos que caracterizam os autoritários de esquerda. Isto significa que, numa academia plural, é de se esperar que surjam estudos sobre o tema.
p.s. a dica do estudo veio de um ótimo episódio do Tôblock.
Urucânia avisa - O pessoal de Urucânia não quer saber de guerra. Gentileza não confundir os nomes.
Ainda neste tema, meu amigo Jorge Washington contou que no início da pandemia, um pessoal de outra cidade mineira, Campanha, ficou apavorado diante da perspectiva de que o hospital da cidade lotasse com a quantidade de gente que iria para lá, conforme o noticiário da época.
Frajolinha vacinada - Inacreditável, eu sei. Mas um hábil colega conseguiu colocar Frajolinha na caixinha. Foi ao veterinário para uma consulta. De quebra, renovou as vacinas que não pudemos lhe aplicar nos dois anos da pandemia.
Voltou arredia, claramente evitando a todos. O dia seguinte foi o dia de seu auto-exílio, mostrando que estava chateada com a inesperada ida ao veterinário. Obviamente que isso também chateia quem sempre lhe faz companhia no início e no final do dia. É da vida…
Tal como no mundo dos seres humanos, gatos também têm variações de humor. Frajolinha me falou disso outro dia e sua teoria sobre estas variações, por demais revolucionária, certamente muda a perspectiva do debate. Esqueça, amigo leitor, estas teorias antigas que vendem por aí. Frajolinha tem uma perspectiva bem original.
Ah, você quer saber qual é a sua teoria? Pois não. Para sua alegria, transcrevo aqui o que ela me confessou, em voz baixa, outro dia, no sofá do saguão. Prepare-se porque vai mudar sua vida.
“- Miau, miau. Miauuuuuuuuuuuuuuuu, nyan, nyan, nyan. Miau. Miauuuuuu. Miau. Nyan, nyan. nyaaaaaaaaaaaaaaaaaaaan.”
Viu só? Eu disse que iria ser um sucesso. Não precisa me agradecer. Frajolinha perde o amigo, mas não a piada. Acho que por isto nos damos tão bem.
Bill Savage - Marcou minha infância. Saiu aqui pela Ebal nos anos 70. Sim, falo de 2000A.D., o quadrinho britânico que nos deu Juiz Dredd e Bill Savage, dentre outros tantos ótimos personagens.
Bill Savage é um britânico que se revolta contra os invasores volganos que ocupam o país numa invasão ficcional. A cada número da revista, o aguerrido britânico mata alguns volganos que, instalada a ditadura socialista no país, perseguem incansavelmente a resistência.
Eu comprei estas revistas quando tinha 8 anos de idade, se não me engano. Ficou marcada em minha memória, a decepção com a descontinuidade do título. Lembro-me de ir à banca de jornais e voltar chateado com a ausência de novos exemplares...
Há poucos anos, procurando em sebos, consegui reaver minha coleção dos nove ou dez números de 2000 A.D. (ainda penso em encaderná-los) e, recentemente, comprei, do original britânico, as histórias clássicas (ou seja, estas mesmas da minha infância) que foram relançadas (o link está aí adiante). A editora os vende em formatos digitais.
Imagine a alegria que senti ao poder, finalmente, seguir com a sequência de histórias interrompidas há quase 50 anos! Dan Dare, Bill Savage, Juiz Dredd, os Harlem Heroes… É, não acabei de ler porque não sou mais um moleque (não sou?) com tanto tempo livre (é, isto é verdade!). Mas os arquivos estão aqui, salvos, e, aliás, preciso retomar a leitura.
De todo modo, acho que que a Ucrânia terá seu próprio Bill Savage…
Suicídio - O primeiro artigo que usou a teoria econômica do suicídio com dados brasileiros, salvo engano, foi o nosso. Ele não foi citado em recente trabalho que parecia fazer uma - aparentemente abrangente - revisão da literatura. Nem sempre o pessoal é cirúrgico nas revisões.
Quem disse que cientista é ser infalível? Só quem não faz ciência pensa assim.
Ainda a guerra - Alguém disse algo assim no Twitter: veja, o que você, francês (ou alemão, não sei) acharia se alguém invadisse seu país com tanques e fartura de disparos e nós, da Ucrânia, projetássemos a cor da sua bandeira em um prédio público.
Pois é. Você pode não gostar de guerra, mas acho difícil achar que estará ajudando fazendo show na praia ou pintando postes. “- Ah, Claudio, mas a democracia da Ucrânia não é perfeita, lá tem muita injustiça…”. Bem, volte ao que eu disse no parágrafo anterior. Não vivemos no mundo perfeito.
As pessoas mais ingênuas - mas sinceras em seu desejo de paz - torcem o nariz para o conceito de equilíbrio do terror, mas como Gellner me lembrou em seu Condições da Liberdade - A Sociedade Civil e Seus Rivais, já mencionado anteriormente nesta newsletter, foi este equilíbrio que manteve o mundo num equilíbrio de poucas guerras ‘quentes’.
Aliás, entre uma guerra fria e uma quente, não tenho dúvidas: a primeira é a melhor opção. A propósito, o leitor que conhece um pouco de Teoria dos Jogos sabe que essa chamada MAD (mutual assured destruction) é um equilíbrio que, paradoxalmente, gera paz1.
Inevitavelmente vem à mente o famoso discurso de Chamberlain, após a anexação dos Sudetos Checos por Hitler, em que o chanceler expressava sua crença de que a anexação significava paz em nosso tempo. Pode não ser exatamente a mesma coisa, mas não é irresistível pensar no pior cenário?
Reflexão bem no meio da sua testa - Fábio Danesi, como sempre, com ótimas reflexões.
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Raymond Aron também tinha esta noção mais realista e menos utópica da realidade. Sobre teoria dos jogos, ok, eu sei que você pode construir um jogo com hipóteses diferentes que gere um resultado diferente. Mas, para mim, a história nos mostra boas evidências de que, ao menos em um mundo com duas superpotências, o equilíbrio MAD funciona como um inibidor de uma guerra total.