Você não leu Russell Kirk - História Econômica - Caça-Fantasmas - Confiança e Regulação - Drivers? - Não somos donos de ninguém - Os Pioneiros - Cinderela 77
Acabou-se o que era doce...e o que não era também.
Aqui está o v(4), n(23), prezado(a) leitor(a). Os dias se passam e os absurdos vão se normalizando…ou não?
Você não leu Russell Kirk - Um socialista (cabelo azul, havaianas, camisa com mensagem de protesto genérica), um liberal (cabelo curto, camisa do Flamengo, calça jeans, sapatos), um conservador (rabo de cavalo, barba marxista, gravata borboleta, pin de alguma entidade religiosa, sapatos novos) e um fascista (quepe cobrindo o corte moicano, camisa e calças pretas, coturnos) entram em um bar e se sentam à mesa pedindo, rapidamente, ao garçom, chopps e uma porção de linguiça calabresa.
Passam-se uns 10 minutos e a conversa começa.
“- Olha, eu acho que o socialismo não deu certo em nenhum lugar do mundo.
- Eu também acho.
- Revolução? Despreza o que há de tradicional…
- Vocês estão sendo injustos. Precisam estudar mais, afinal, qual definição de socialismo estão usando?”
Os outros caíram na gargalhada.
“- Ué, agora você quer incluir detalhes? Comigo você faz o contrário, vive chamando todo mundo de fascista, sendo que apenas eu sou.
- É, e também vive chamando este liberal aí de conservador sendo que…
- Nem vem, conserva, ele chama todo mundo de liberal quando bebe dois copos de cachaça que eu sei.
- Em minha defesa, eu só chamo quando meu partido diz que é para dizer.
- Querendo pagar de “olha, meu partido tem raízes e sou homem de partido”, mas ignora a corrupção dos seus caciques, né?
- Lá no meu partido fascista não tem este problema. A gente mata os corruptos.
- E o Mussa, enforcado na Itália, heim?
- Não acabei de dizer?
- Já que tocamos no assunto, o fascismo é um fenômeno mais complexo…
- E o meu socialismo não?
- Só quando lhe convém, né?”
Os demais: uhhhhhhhhhhhhhhhhhhhhhhhhh!
“- Vocês falam isso porque não leram os clássicos.
- Que clássico o que, mané?
- Vocês sabem…os clássicos…
- Cita aí um, de cabeça.
- Nem vem, seu liberalzinho prudente e sofisticado…
- …disse o conservinha que só assiste missa em latim e usa gravata borboleta…
- Não enche, né?
- Você não leu Russell Kirk! Eu bem sei. Só leu fichamento do coleguinha…
- Ah tá, agora quer que eu leia tudo…e o tempo?
- Segundo o liberalismo do qual você desdenha, o tempo tem um custo.
- Eu, pelo menos, uso uniforme…
- É, uniforme preto.
- Racista, você né?
- Impossível, sou socialista, não posso ser racista. Aliás, o racismo é um fenômeno complexo…
- Tão complexo que você não saiu da universidade até hoje, né? Ha, ha, ha.”
Já no fim da porção e dos chopps, os amigos improváveis se preparam para dividir a conta.
“- Eu acho que quem tem que pagar são os mais ricos.
- Eu acho que só os judeus devem pagar. Como eles são os mais ricos, ‘tamojuntos’!
- E viva o Hamas!
- Sim, viva o Hamas!
- Ok, belo casal vocês formam, mas eu acho que deveríamos dividir a conta conforme o que cada um consumiu.
- Lá vem você…a gente sempre sai e a tradição me diz que…”
Todos se viraram para o conserva(dor).
”- …que…bem, pensando bem, a gente nunca chega em um acordo sobre esta divisão.
- Vamos ter que usar a mesma estratégia da última vez?
- É…”.
O fascista tira uma moeda do bolso.
“- Ah, não, de novo esse negócio da moeda? Eu sou, claramente, um sem-dinheiro…
- Nem vem, comuna.
- É, cala a boca. Deixa de ser pão-duro.
- Olha a opressão!
- Cara, você mora no bairro mais rico da cidade, com os pais, e já tem mais de 21 anos!
- Vai me julgar agora, seu fascistinha?
- Ei, ei…vamos lá, pessoal. Tem a festa na orla ainda…pagamos aqui e vamos.”
O jogo da moeda dos amigos era simples: decidido se cara ou coroa representava o pagamento, cada um jogava a moeda. Caso ninguém fosse ‘premiado’, fazia-se uma segunda rodada, depois uma terceira, até que houvesse pagador(es).
Na primeira rodada, todos foram agraciados e a conta foi dividida igualmente, para a alegria do socialista. Foram para a festa na orla da praia, em homenagem ao aniversário de famoso imortal da Academia Brasileira de Letras.
História Econômica - Dois grandes especialistas: Mark Koyama e Jared Rubin. Um pouco do seu tempo bem investido com esta conversa? Claro! Aliás, eu preciso terminar este livro (este e um monte de outros livros…).
Um longo, mas importante trecho de uma das falas do prof. Koyama sobre o que poderíamos chamar de falácia do argumento da colonização.
About pillaging and colonization. It’s just the wrong way to think about it because the transformation and the size of the economies we’re talking about is just so great, at least over two centuries, that it can’t be explained by taking stuff from other places. The British did loot India, there are guys like “Diamond” Pitt and Robert Clive who made themselves very rich by stealing diamonds and exploiting people in India.
But on the scale of the transformation that we’re talking about, that’s not very massive, not sizeable enough to do any of the explaining. McCloskey, in one of her Bourgeois books, makes this point very clearly; their arithmetic doesn’t hold up. So, if you want to tell a story where colonization does play a central role in the divergence, you have to tell a specific story about particular industries having very dynamic or very particular properties having to do with increasing returns to scale. Whereby this one industry was responsible for transforming the entire economy. So be it sugar, potentially, or cotton textiles, I just don’t think those stories are particularly compelling. It is possible to imagine an industrial revolution or the origins of modern economic growth happening in Western Europe, even if Western Europe hadn’t been nearly as involved in exploiting and conquering other parts of the world.
Muito bom, não?
Caça-Fantasmas - Sim, eu vi o último filme (obrigado, Amazon!) e, sinceramente, não entendi porque ele ficou tão pouco nos cinemas. Tal como o anterior (podemos esquecer, tranquilamente, aquele remake com as três atrizes, que ficou péssimo…), este tem o mesmo espírito do original (no pun intended): diversão despretensiosa, sem apelações ou forçadas de barra ideológicas.
Ultimamente o povo só quer ver política em tudo (ninguém leu, ou ‘leu e entendeu’ Norberto Bobbio, pelo visto…), como se tudo se resumisse à política. Depois não sabem como é que o povo se tornou tão radical, né? Olha o que ensinam nos colégios há anos, olha o que parte da big media tem propagado e você verá que as mensagens estão longe de serem um incentivo à tolerância (sem tolerância, não há diversidade pacífica)…não é o que desejo quando procuro um filme para passar o tempo.
Assista ao filme. Caso você seja fã da franquia, aposto, não vai se decepcionar.
Confiança e Regulação - Neste artigo, publicado na Public Choice de 2021, os autores encontram um resultado interessante. A confiança (trust) tem uma relação positiva com a eficiência de mercado e negativa com a regulação.
O ponto teórico é até simples: sociedades com altos níveis de confiança geram queda nos custos de transação, favorecendo as atividades produtivas (profit-seeking) em relação às improdutivas (rent-seeking). Ou seja, empreendedores se voltam para atividades que agregam bem-estar para a sociedade.
Claro que alguém pode se perguntar sobre o Brasil. Há vários estudos a serem feitos por aqui e não vejo um indicador municipal ou estadual de confiança que possa ser usado, mas, bem, você pode começar este trabalho de investigação científica...
Drivers? - Quando começou essa mania de chamar os determinantes/possíveis causadores de X de “drivers de X”? De onde veio isso? Há salvação?
Não somos donos de ninguém - “Como seria bom se todo mundo fosse dono de si mesmo e de ninguém mais, não? Seria um alívio.”, pensou Horácio enquanto caminhava pelo bairro, apreciando a paisagem.
Claro, Horácio não pensava na escravidão. Nunca lhe ocorreu ser dono de seres humanos. Primeiro porque daria um trabalho incrível e, segundo, porque não é algo que se aceite em uma sociedade livre. "Quem, em sã consciência, iria querer ser dono de alguém assim?”, perguntava mentalmente, enquanto apreciava o jardim colorido de um prédio.
Cumprimentou um senhor que passeava com seu cachorro e continuou a caminhada pensando no tema. Ocorreu-lhe que há pessoas que pensam serem donas de outras por algum problema psiquiátrico - que, para os mais jovens acometidos por estes problemas, é apenas uma questão de expressão de sua individualidade (e quem é contra só pode ser fascista, patriarcal e a favor do genocídio de mulheres negras na faixa de Gaza (ou é apenas neoliberal mesmo!)).
É que muita gente pensa que os outros vivem para lhes servir. É quase como se as outras pessoas fossem peças de um tabuleiro que, se arrumado de acordo com o desejo do sujeito, forma um contexto, um quadro ou uma paisagem que poderia ser apreciada pelo egoísta como um (eterno?) momento belo de sua vida.
“Momentos belos”, refletiu Horácio, “que se confundem com os verdadeiros momentos belos, nos quais as interações sociais são voluntárias”. Alguma dor sentiu no joelho esquerdo e encostou em uma mureta. Olhou para o céu e não encontrou nuvens. Mesmo assim, enxergou no céu alguns rostos conhecidos que, de um modo ou de outro, relacionavam-se com sua vida recente e, claro, com sua reflexão.
“É, muitas vezes achamos que somos donos dos outros. Talvez porque sabemos que nem todos se lembram do que deveriam se lembrar. A gratidão nunca é eterna e muitos se esquecem tão rápido que desejamos poder ser donos destas pessoas para lhes lembrar de nosso amor”, pensou enquanto sentia que poderia caminhar mais um pouco.
O sol não estava tão quente e a quantidade de pessoas com cachorros nas calçadas aumentou bastante. Um ou outro casal passeava com um carrinho de bebê, mas a maioria era mesmo acompanhada dos amigos de quatro patas (ou, simplesmente, aumigos).
“Vez por outra exageramos nesta ‘posse’ por bons ou maus motivos…puxa, talvez eu tenha sido injusto com Marina, minha amiga, na semana passada…mas ela também me reclamou de falta de atenção…ora, eu não sou obrigado a lhe dar satisfaçã…opa…talvez ambos tenhamos exagerado. Ninguém é dono de ninguém, mas é nosso amor (preciso dizer que é mútuo?) que nos deixa aflitos por um pouco de afeto”.
Horácio parou de caminhar. Do outro lado da rua, o sinal de pedestre esverdeou. Precavido, olhou para os dois lados e permitiu-se um atravessar moderadamente rápido e firme. Deu de cara com um adolescente vendendo balas na porta da padaria. Educadamente recusou e seguiu até a esquina. Atravessou, virou à direita e seguiu em direção à outra padaria.
Não somos donos de ninguém. Queremos, de certo modo, ser, ao menos um pouquinho parte da vida de algumas pessoas. Sabemos também que não podemos decidir isto assim, autoritariamente e, claro toda esta reflexão terminou, bem ou mal, temporiamente após um café e um pão de queijo na outra padaria.
Os Pioneiros - Aproveitei o feriado para maratonar a 9a temporada de Os Pioneiros (Little House on the Prairie). Impossível não se impressionar com a qualidade dos roteiros e atuação das personagens. Sempre volto à esta série aqui porque realmente acho que, se você deseja transmitir mensagens de tolerância, honestidade, valor das coisas, enfim, estes valores que tanto ajudam para uma vida saudável em sociedade, bem, esta é a série.
Ah, eu nunca havia notado que a problemática Shannen Doherty havia começado sua carreira, ainda criança, como a sobrinha de Laura Ingalls (Melissa Gilbert) nesta que seria a derradeira temporada de uma das séries de maior sucesso da TV norte-americana (e da brasileira).
Cinderela 77 - Achei sensacional - surpreendeu-me mesmo! - a técnica narrativa no último capítulo desta antiga novela da Rede Tupi. Aliás, foi a primeira vez que vi um último capítulo ter…cenas do próximo capítulo!!
Por hoje é só, pessoal e…até mais ler! (*)
(*) “até mais ler” foi plagiado do Orlando Tosetto, cuja newsletter, aliás, você deveria assinar.
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