Praça Nova Iorque - A tentação do banal - O IBLAT - O 15 de novembro - Outros assuntos.
Vá bugiar!
O v(3), n(24) da newsletter está no ar, goste você ou não.
Praça Nova Iorque - No final dos anos 70, nossa família viveu por um curto espaço de tempo em um prédio de três andares. Um dos que ficavam em torno da Praça Nova Iorque, no bairro Sion, em Belo Horizonte.
Estive lá por estes dias, de forma inesperada. Havia cortado o cabelo lá perto, almoçado, e pensava em comprar algo para meu lanche. Em outras palavras, precisava de um bom supermercado, não muito longe do pequeno estabelecimento no qual comi um bife à parmegiana (não é uma das minhas refeições favoritas, mas a opção era um mexido e, bem, estamos no início da semana…).
A simpática senhora me disse que encontraria um bom supermercado virando certa rua à direita, em uma praça. Foi o que eu precisava ouvir para desencaixotar várias memórias dos meus 7/8 anos. Naquele tempo, a cidade tinha menos prédios. Nós tínhamos menos dinheiro e vivíamos de aluguel. Meu pai, então, tinha um dos fuscas (creio que teve dois ou três) que era um carro popular comum na época.
Na praça, nós, crianças, divertíamo-nos muito. Havia, descendo uma das ruas, um lote cheio de mamonas e, bem, a guerra de mamonas era uma das mais divertidas - e terríveis - brincadeiras das crianças da época. Hoje em dia, as crianças acham que ‘mamonas’ era somente uma banda com músicas de letras irreverentes.
Voltando à infância, lembro-me também de um menino da turma que tinha um carrinho de rolimã (eu morria de medo desta arma) e de um outro que morava em um prédio acima, ali mesmo na praça, cujo pai era rico e tinha uma espécie de ‘ferrorama’ importado. Nunca o vi montado.
Foi no tempo em que ali residimos que nós, crianças do prédio, atormentávamos as empregadas e donas de casa tocando campainha e saindo correndo pelas escadas. Não havia internet, nem jogos eletrônicos. A socialização era unicamente presencial, como hoje se diz. Em outras palavras: você tinha que chamar seu amigo para brincar.
A praça, hoje, está um pouco mudada. Os prédios, a despeito das fachadas reformadas, são idênticos aos que habitam minhas lembranças. Não me lembro o número do apartamento em que moramos, mas eu me senti cumprimentado pelo antigo prédio. Foi como se reencontrasse um velho amigo.
Nem sempre temos a sorte de reencontrar casas ou prédios de uma época distante. Tive sorte.
A tentação do banal - Quem nunca experimentou momentos de ‘vazio de inspiração’? Comigo acontece sempre. O primeiro pensamento que me ocorre nestas horas é o de tentar escrever sobre a falta de inspiração. É tentador, não é? Só que é melhor evitar.
Afinal, não é só uma única vez que a falta de inspiração invadirá seu dia. O melhor é sempre tentar buscar outro tema para escrever. Nem que seja um tema que pareça, de início, pouco interessante. Com um pouco de esforço e algum talento, você consegue transformá-lo em algo melhor. Jamais caia na tentação do banal.
O IBLAT - Lançaram ontem o Índice de Burocracia na América Latina (ou ‘en Latinoamerica’). Abreviadamente, IBLAT. O Brasil, aliás, está em primeiro lugar no índice, tanto na primeira, quanto na segunda edição.
As duas edições referem-se ao período 2021 e 2022. No primeiro caso, 6 países foram analisados (um deles, curiosamente, era a Espanha). Na segunda, 11 países da América Latina foram considerados (estes países correspondem a 81% do PIB da região em 2021, medido em PPP, com base em 2017, segundo me informa o banco de dados do Banco Mundial).
Eis um trecho que interessará aos pequenos empreendedores.
Lidera la serie Brasil, que es el país donde la pequeña empresa destina el menor número de horas en el cumplimiento de los trámites burocráticos exigidos. Son en total 180 horas/año en promedio, es decir, 7,5 días continuos o 22,5 jornadas laborales. Al interior de ese país, el sector primario es el que destina el mayor número de horas, con 245 horas/año y, en general, su mayor carga burocrática se concentra en los trámites relacionados con la administración de operaciones (57,77 % del total de horas).
En el otro extremo de la distribución se ubica Venezuela, país donde la pequeña empresa destina el mayor número de horas/ año en el cumplimiento de los trámites exigidos. Son en total 1062 horas/año, que equivalen a 44 días continuos o 133 jornadas laborales. En este caso, es el sector terciario el que destina el mayor número de horas al cumplimiento de los trámites exigidos y, en general, la mayor carga se concentra en los trámites relacionados con la administración de operaciones (69,67 % del total de horas).
Possíveis determinantes deste resultado, diz o relatório, são a Lei de Desburocratização (13.726/2018), a criação do ‘gov.br’ (9.756/2019) e a Lei de Liberdade Econômica (13.874/2019), a estratégia do governo digital (10.332/2020), a Lei de ambiente de Negócios (14.195/2021) e os Cartórios Digitais (Lei 14.382/2022).
Claro, estas leis diminuem o custo de transação no que diz respeito ao tempo gasto com procedimentos. O que o índice não mede é o custo monetário dos procedimentos (por exemplo, quanto custa cada procedimento realizado em cartórios?). Assim, você pode até ficar otimista, mas sugiro moderação.
O 15 de Novembro - Em O 15 de Novembro e a queda da Monarquia - Relatos da princesa Isabel, da baronesa e do barão de Muritiba, da editora Chão, há um belo relato de um diálogo da princesa com alguém que ela chama de ‘oficialzinho’.
O ‘oficialzinho’ tenta argumentar que a chegada da República seria inevitável. A princesa concorda, mas diz que achava que isto dar-se-ia com o processo democrático, com eleições de mais e mais deputados republicanos. É quando o oficial lhe diz:
“- Assim nunca poderia ser feita, porque o poder é o poder”.
A princesa insiste e aponta o caráter golpista dos militares e o oficial insinua que a nova Constituinte seria uma solução, digamos, democrática. É quando a princesa lhe diz:
“- Não disse o senhor que o poder é o poder?”
O diálogo está nas páginas 46-47 do livro. Irônico como a percepção do oficial seja, talvez, mais absolutista da que a da princesa.
Queima de livros - Da minha adolescência, lembro-me bem, as pessoas valorizavam a leitura, sem questionar a fé, a ideologia ou a raça (raça?) do autor. Lia-se de tudo, o que gerava um conhecimento rico, capaz de comparar discursos de pilantras com os de bons escritores, por exemplo.
Era também uma época em que todo mundo (sem exceção) condenava a queima de livros promovida pelo nazismo. Não havia uma alma viva que dissesse coisas como: “queimou os livros, mas…”. Não havia ‘mas’. Condenava-se a queima de livros e a liberdade de expressão era inquestionável.
Aliás, assim nasceram diversas concepções de mundo e hipóteses científicas (e outras, nem tanto) e, bem, o resto é história. Você sabe o quanto evoluímos com esta visão que, discordando da religião, da fé ou da ideologia de alguém, respeitava o direito de cada um se expressar livremente.
Os anos passaram e, bem, parece que agora é bonito dizer que se deseja queimar livros. Não é uma fogueira das vaidades. É uma fogueira da humanidade. O sujeito lança ao fogo sua humanidade em troca de um prato de lentilhas (Miguel Reale adorava usar esta expressão…) que ele pensa ser um prêmio Nobel.
Tenho pena desta gente. Saem da civilização e se enfiam na lama, voluntariamente. Não, não sou um velho chato. Acredito na capacidade humana de aprender com os próprios erros. Só não sei quanto tempo isso leva (e nem se o aprendizado é transmitido de pais para filhos).
Ah, que se dane. Vou aproveitar os livros que li e que lerei. Cada um cuide de sua vida e, por gentileza, não me importune. Ou bata (à porta) antes de entrar. Caso eu não esteja ocupado, pode ser que eu o atenda.
Agora, amigo assinante, preciso ir. Estou atrasado. A gente se vê no sábado.
Por hoje é só, pessoal e…até mais ler! (*)
(*) “até mais ler” foi plagiado do Orlando Tosetto, cuja newsletter, aliás, você deveria assinar.
Caso queira compartilhar, clique no botão abaixo.
Talvez você seja novo por estas bandas. Rapidamente: publico duas vezes por semana, geralmente às quartas e sábados. Eventualmente há algumas edições extraordinárias. Assinar (custo = R$ 0.00 + valor do seu tempo para apertar o botão subscribe com seu endereço de e-mail lá…) me ajuda bastante. A temática? De tudo um pouco. Confira os números anteriores aqui.