O v(5), n(24) não chegará atrasado. É uma promessa. Vejamos se a cumprirei.
Pássaros - Pássaros cantam na manhã de domingo e me deito no sofá porque a madrugada foi quem me viu acordar, juntamente com os quatro olhos de Mii e Momo, os peraltas da casa que não podem ver meus pés na cama que sentem um desejo irresistível de atacá-los.
Deitado no sofá, acompanham-me os dois - até uma hora antes, agitados felinos - tranquilíssimos Mii e Momo. É certo que Momo escalou a tela da janela da sala, ainda em um resquício da energia despendida no final da madrugada. O sol já clareou o dia e, deitado, vejo-me acompanhado dos dois, em companhia fiel e certamente esperançosa de que voltarei às brincadeiras inesgotáveis com eles.
Enquanto escrevo, brincavam silenciosamente em minha cama e, há poucas linhas, uma bolinha de borracha rosa surgiu na porta do escritório, seguida pelo rosto de Mii. Bem, lá vou eu.
Piadas - É hora de dar uma banana a quem defende que piadas devam dar cadeia. Talvez não só uma banana, mas uma condenação com encarceramento e indenização. Seria educativo. Aliás, sobre isto:
Acho curioso o argumento de alguns que se resume a: “você pode fazer piada com o que quiser, mas eu posso processá-lo”. Eu concordo que você possa dizer isto a alguém que contou uma piada, mas o problema é que, em um regime totalitário moderno (estes que se disfarçam de democracia), tudo é motivo de processo. Ora, se a lei diz que tudo pode ser transformado em processo - o que é o mesmo que dizer que pessoas não conseguem resolver problemas por si só e que a tolerância é um valor a ser abandonado - de que adianta o argumento citado?
O problema não é você poder processar - advogados adoram, claro - o problema é quando você abre as portas para a judicialização de tudo. Daqui a pouco, posso processar você por me dizer que pode me processar. Sei lá, invento algo: racismo (que agora é igual a homofobia, embora homossexualismo não seja raça como qualquer criança sabe), assédio moral, que sou minoria etc.
Sociedade da tolerância ou da confiança my ass, né?
Passeios - Enquanto isto…o nosso grande Adalberto só faz passear. Que inveja!
Badé - As pequenas crônicas do Badé seguem resgatando o lirismo dos bairros…ou pelo menos de um bairro.
O amor - Sentado em frente ao computador, ele tinha que dissertar sobre o amor. Ninguém havia lhe pedido - ou exigido - isto: ele mesmo havia decidido que teria que escrever sobre este misterioso ‘amor’. O problema é que não havia tido tantas experiências amorosas assim, o que, aliás, incomodava-o. Afinal, quantas experiências amorosas são necessárias para se falar de amor?
Pensou, então, em começar do mais óbvio: quem era este tal de amor? Seria uma ave? Mamífero? Teria alguma peculiaridade que o distinguiria dentre os outros animais? Alguém já havia mesmo falado de “fazer um amor animal”… Evitou procurar definições pois tinha medo de se contaminar com o pensamento alheio.
Foi assim que o amor virou um animal de quatro patas com aproximadamente 3 metros de comprimento e 2 de altura, mamífero, que habitaria a alma de cada ser humano vivo deste planeta. O amor se alimenta, claro. Do quê? Bem, ele definiu que o amor seria guloso, sem restrições alimentares o que, obviamente, às vezes o deixa obeso e com problemas de saúde.
O amor não seria um animal social, nem tampouco um ermitão. Ele só queria ficar na dele, saindo de vez em quando para um passeio e para ver outros amores. O problema é que os amores não conversavam, mas, como os gatos, cheiravam-se. Assim que, para ele, o amor era de uma cheiração só. Como gostava de gatos, definiu também o amor como um animal autolimpante que sabia usar o banheiro corretamente.
O amor poderia ter preferências por times esportivos, músicas, filmes, livros etc. Em seu caso, o amor era corinthiano, curtia rock nacional, filmes de Steven Spielberg, Tarantino e Felini. Também curtia a Uma Thurman, Jacqueline Bisset, Peter Falk, Adam Sandler, Peter Sellers, Woody Allen e Caroline Munro (por motivos óbvios!). Em termos de livros, o amor de nosso abilolado autor curtia Millôr, Machado de Assis, o Barão de Itararé, Tolstoi, Graham Greene e Joseph Conrad.
Eis que seu amor tinha problemas também. Uma certa esquizofrenia entre o amor e o prazer, numa dose moderada, alimentava suas fantasias de maneira um tanto quanto incômoda mas, para isso, claro, existem os psicanalistas amorosos e os remédios aos quais os amores poderiam recorrer mediante consulta e receita médica. Tal qual em nosso mundo, alguns amores médicos são meio picaretas e daí receitas desnecessárias poderiam existir. O mundo do amor é parecido com o nosso.
Segundo nosso autor, que já estava todo animado com seu estranho, estranho amor, o amor teria surgido em 1765, em Amsterdã, fruto de um experimento malsucedido de um alquimista belga exilado na cidade por conta de problemas com as autoridades fiscais de seu país. Embora europeu, este amor tinha pele morena e cabelos loiros e era do sexo feminino.
Ainda aos dois anos de idade, diante da falta de um companheiro, o alquimista lhe criou um outro amor, companheiro, branco, dos olhos castanhos e pele amarela, do sexo masculino para que pudessem, eventualmente, procriar e assim foi feito quando, aos 25 anos de idade, ambos se casaram em uma igreja pertencente a uma obscura seita religiosa que envolvia cultura esquimó e misticismo celta. Sim, é difícil entender os desígnios do amor.
Posteriormente, o alquimista descobriria um jeito de plantar o amor, em um processo semelhante ao do café, o que explicaria a fama do amante latino, tão presente na cultura ocidental. Pois é, os trópicos tristes também gerariam os amores mais exóticos.
E esta é a origem do amor, segundo nosso autor imaginário. O que eu acho disso? Olha, nem arrisco…
Cecília Meireles - Recebi este da Cecília Meireles de uma amiga:
Motivo
Eu canto porque o instante existe
e a minha vida está completa.
Não sou alegre nem sou triste:
sou poeta.
Irmão das coisas fugidias,
não sinto gozo nem tormento.
Atravesso noites e dias
no vento.
Se desmorono ou se edifico,
se permaneço ou me desfaço,
- não sei, não sei. Não sei se fico
ou passo.
Sei que canto. E a canção é tudo.
Tem sangue eterno a asa ritmada.
E um dia sei que estarei mudo:
- mais nada.
Eu li, reli e li novamente e me peguei pensando na mudez que inevitavelmente virá. Por aqui, neste dia fatídico, gostaria de estar cantando um belo Enka…
(*) “até mais ler” foi plagiado do Orlando Tosetto, cuja newsletter, aliás, você deveria assinar.
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Sensacional essa edição, obrigado por partilhar esse lindo poema da Cecília.
Valeu, Shikida!