O gato na caixa. As loiras e a fila da pegação. Festas felizes. Músicas. Gilgamesh. Donpan.
Por que a Golden Gate é vermelha? O governo precisa fazer algo a respeito.
Chegando o v(2), n(76) da newletter. Um pouco corrido aqui, mas já venho limpar sua mesa. Leia o cardápio enquanto isso. A casa sugere bolinho de feijoada.
Gato na caixa - O gato está numa caixa, destampada. Ele deseja profundamente um pano que está do lado de fora. Ele insistentemente arranha-a, no mesmo lugar, tentando fazer um buraco para alcançar o pano.
Este era seu sonho.
Sentou-se à mesa com os amigos e lhes contou a respeito. O que achavam? Qual o significado daquilo? Seria ele um gato? Ou só o Natsume Soseki?
Não deu outra. Surgiu uma discussão sobre o significado do maldito sonho e, aos poucos, a mesa convergiu para duas opiniões, não necessariamente complementares.
A primeira, meio óbvia talvez, é que o gato representava a pessoa (no caso, ele) que, ao invés de tomar logo uma atitude e pular fora da caixa, insistia em sofrer em sua empreitada trabalhosa (que talvez pudesse até ser inútil). Sofria, pois, o gato, por não se esforçar pelo caminho alternativo de pular logo fora da caixa e agarrar seu desejado paninho.
Parte da mesa aprovou esta primeira tese. Já o restante se alinhou em torno da segunda.
Nesta, o gato deveria ficar na caixa e insistir em seu metódico arranhar (no sonho, não falei antes, a região da caixa que ele arranhava já estava preta…uau, isso muda tudo, não é? Agora é tarde…). Este representaria o esforço árduo, dentro dos princípios que o sonhador sempre buscou seguir em sua vida. Alcançar o pano seria importante, mas viria como resultado deste trabalho de formiguinha (o que valorizaria seu esforço).
Alguém acrescentou que a diferença seria de uma mudança de estratégia para se alcançar o pano que seria a de uma súbita mudança (o salto para fora) contra constantes esforços marginais (os arranhões) e que não importavam muito as considerações morais (ou normativas) sobre os ‘princípios de vida’. Como esta pessoa era economista, foi solenemente ignorado(a). Alguns ainda tentaram lhe expulsar da mesa, mas a amizade prevaleceu.
Opiniões divididas, todos voltaram-se para o sonhador. O que ele achava das duas teses? Supondo que fossem interpretações razoáveis, ou deveria tomar uma atitude e romper com tudo o que o limitava, deixando para trás hábitos que, poder-se-ia dizer, definiam-no? Ou deveria, respeitando suas idiossincrasias, insistir com a persistência de um artesão de espadas japonês até atingir seu objetivo?
Mais ainda, precisava supor que os cursos de ação derivados das duas interpretações, fossem os mais adequados, para não dizer, precisos (melhor não dizer mesmo, ou vamos abrir outra discussão…). E havia ainda a incômoda colocação do economista que, bem ou mal, fazia algum sentido.
Paralisado entre as duas teses, pensou que, fosse ele mesmo o gato, em alguns momentos, adoraria saltar da caixa (e, em outros, preferiria seguir arranhando-a). Os amigos ainda esperavam sua decisão quando, subitamente, acordou.
Já não sabia se tinha experimentado um sonho ou um sonho dentro de outro. Saltou da cama e caminhou lentamente até a cozinha, preparar seu café. Sua pequena gata acompanhou-o até a sala. Saltou-lhe em seu colo e, calmamente, ajeitou-se para os afagos de seu dono. Deu-lhe o pouco de afeto que necessitava para suportar mais um dia de trabalho.
p.s. Talvez os sonhos possam se revelar pouco úteis para uma tomada de decisão. Ou talvez haja um autoengano necessário nas interpretações que deles fazemos. Essa de cherry picking o sonho conforme a interpretação que você pensa ser a melhor não me parece uma boa idéia (embora agradável para quem escolhe…).
As duas loiras e a fila da pegação - Aconteceu em um aeroporto. A primeira intercorrência (acho que, de fato, é uma intercorrência) ocorreu na fila do raio-x que não é de pegação, entenda-me bem!
Quando já se aproximava a minha vez, a loira se aproximou, visivelmente transtornada, e me perguntou sobre se meu vôo estaria próximo de seu fatídico horário. Pela expressão de surpreendente paz estampada no meu rosto, só posso imaginar que a moça não enxergava bem.
Antes que ela terminasse de se explicar, soltei um sonoro e resoluto pode. A fila andava e mais um minuto seria fatal. Deu tudo certo e ela ainda me agradeceria após a inspeção da bagagem, recebendo um sincero boa sorte de minha parte.
Resolvi tomar um café quando fui positivamente surpreendido pela pequena fila para se comprar produtos da lanchonete. Posteriormente eu seria negativamente surpreendido pelo tamanho das duas filas de retirada de produtos, novidade para mim. Pensei comigo mesmo: só pode ser a fila da pegação (note: pensei, não disse, nem em voz baixa. Não queria que roubassem meu insight. O bacana da coisa toda é dividi-lo com meus assinantes!).
Como o que não tem remédio, dizem, remediado está, lá estava eu em uma das filas da pegação, quando, outra moça, que estava à minha frente, subitamente virou-se (não, seus longos cabelos lisos não se moveram em câmera lenta...não era propaganda de shampoo) e me questionou sobre se eu poderia lhe dar alguns segundos para que se afastasse e levasse sua mala para alguma mesa próxima. Antes que a segunda loira se alongasse nos prolegômenos (vai que é formada em Direito, né?), soltei um 'claro'. Também me agradeceria depois.
As chances de duas loiras educadas me pedirem uma gentileza em menos de uma hora, não sendo eu um encarregado de ajudar as pessoas (algo que, aliás, não faço muito bem) são próximas de zero. Contudo, leitor, veja que a vida em sociedade é cheia destas situações estranhas. Todo mundo tem seu momento de anjo.
p.s. Ninguém perguntou, mas, na ocasião, eu apenas tomei um café duplo.
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Mas nem todas as festas são felizes demais - A vida não é exatamente uma sucessão de festas felizes. O importante é saber otimizar sujeito às restrições que nos são impostas. Por exemplo, dada a tecnologia, como conhecer gente legal?
Afinal, um dos acontecimentos mais incríveis da vida é fazer, inesperadamente, amigos. Não são muitos, mas a gente faz.
Isto é algo que me veio à mente (ou ao que ocupa o lugar dela, em minha caixa craniana) ao conversar, dia destes, com o Magno sobre o tema da tecnologia e sua relação com as amizades.
A tecnologia tem facilitado nosso contato com pessoas com as quais jamais conversaríamos. Foi assim, há mais de 20 anos, com o Leo, por exemplo, o que me torna um pioneiro exemplo disso, creio. Aliás, o Magno mesmo se lembra de me conhecer pelo blog. Bons tempos!
Mais recentemente, os contatos internáuticos me proporcionaram novas festas felizes e, com elas, novos amigos. Já está de bom tamanho para mim. Festas felizes, eternas mesmo, só no paraíso e eu não sei se vou para lá.
Música - O Leo tá preocupado com a música ocidental. Acompanhe a discussão dele. Digo ‘ocidental’ porque ele só menciona exemplos ocidentais (seria ele um neoliberal excludente e preconceituoso? Onde estão os músicos nativos de Papua Guiné? Ou os funkeiros de Java? Ou os tocadores de música gaudéria da Mongólia?). Piadas à parte, olha lá que ficou legal o textinho.
Gilgamesh vem aí - Sim. Mais um pedaço da história a ser reconstruído. Diogo me mostrou isto recentemente. Aguardando, pois, pelas novas edições…
Música bairrista (e bem alegre) - O pessoal da província de Akita tem uma divertida música. A letra, bem, a letra exalta bastante o lugar e, claro, seu simpático povo. É uma música gostosa de se ouvir. Duvido que você acerte o refrão de primeira.
Por hoje é só, pessoal e…até mais ler!
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