O bairrista. Propaganda eleitoral gratuita. J-Pop dos anos 80. Shamisen. Palavras se combatem com palavras, não facas. Outros.
Vá amolar o boi!
Cometo o pecado de enviar o v(2), n(66). Já estou no inferno mesmo. Não vai ser um número novo da news que vai me deixar pior.
O bairrista - O bairrista é um sujeito facilmente encontrado em qualquer nação do mundo. Em algumas variantes, o sujeito também é ultra xenófobo. O Alexandre Soares Silva falou sobre o tema (bairrismo) em sua última newsletter (ou no último número de sua…).
Não há nada de errado em achar que o lugar em que você nasceu tem algo de especial e único, claro. O problema é quando a pessoa, que nunca saiu do local, acha-o a cereja do bolo geográfico.
‘- Você nasceu em Canoas?
- Nasci.
- E qual o melhor lugar do mundo para você?
- Canoas.
- Já morou em outro lugar?
- Não, moço.’
O diálogo ilustrativo, aposto, já foi parte de alguma conversa similar entre o leitor e algum bairrista (basta trocar ‘Canoas’ por outra cidade ou estado). Se você nunca passou por isto, confie em mim, você logo passará.
A busca de um mítico referencial de estabilidade cultural-étnico-etc. parece ser a obsessão de um bocado de gente insegura. Falou ‘hot dog’? Então você cedeu ao imperialismo anglo-saxão. Troque por cachorro quente e você não ouvirá tantos protestos porque, bem, porque os nativos das tribos tupi-guarani foram vitimados por portugueses. Hum, parece que teremos protestos. Ora, então deveríamos buscar uma palavra tupi-guarani. Contudo, quem disse que tupis e guaranis viviam em harmonia?
E por aí vai.
Uma parte da raça humana residente no Brasil (creio que são, digo, somos humanos) vive em busca do útero materno. Uma busca incessante pela pureza (supondo que o útero da sua mãe era puro…). Acham horríveis o nazismo e sua doutrina de pureza racial, mas, de boa (ou de má) fé, cultivam a sua própria doutrina de pureza.
Começa com um discurso bonito, sobre a economia local, a cultura local, ignora a inexistência de estática na história local (o ‘local’, a propósito, nem era o ‘local’ há 500 anos…) e, ao invés de celebrar a dinâmica histórica (embora muitos de seus defensores jurem rezar pela cartilha da dialética marxista), preferem a pintura de uma mítica figura algo rousseauniana em que não há só um bom selvagem, mas uma boa cultura, uma boa sociedade… (boa para quem?).
Não há nada de errado (nem há nada de certo) em se valorizar elementos de algum momento histórico. Criamos museus, em parte, porque gostamos de preservar nossa história e de aprender com ela. Eu mesmo, que não tenho cara de japonês, embora tenha descendência (o nome desta newsletter nunca enganou ninguém, né?), vivo imerso na cultura japonesa. Somente nela? Óbvio que não. Ou você acha que Wodehouse é um autor de Okinawa?
O problema é que não é muito fácil, para algumas pessoas, saber quando ultrapassaram a linha da celebração cultural e passaram para o campo do fanatismo localista. A boa notícia é que o melhor jeito de fazer isto é usar seu próprio cérebro e eu sei que você é racional. A bola está com você.
Mercados funcionam? - Existe uma piada entre os economistas de que se você encontra uma cédula ou uma moeda no chão é porque o mercado não está funcionando perfeitamente.
A piada é boa, claro. Mas o sketch abaixo dá uma nova dimensão ao humor da coisa toda... ^_^
Leituras de qualidade - Esta coletânea tem uma diversidade e uma qualidade incríveis. Trata-se de transcrições de palestras que ocorreram na Enap, nos últimos anos. Alguns nomes? Temos Steven Pinker, Deirdre McCloskey, Tim O’Reilly, Jared Diamond e Vitalik Buterin, para mencionar, algo aleatoriamente, alguns.
O servidor público pode não querer ouvir falar de futuro (vários não querem, acredite!), mas não pode dizer que não teve a oportunidade de fazê-lo com personalidades tão importantes. Pelo menos não se passou por uma ou várias destas conversas.
(Propaganda eleitoral gratuita…e de qualidade) Juó Bananére em campanha - Os inletôre giá sabem chi ‘stou em campagna presidenciale. Eh! A genti tutta du populo vá indiscobrí u meu nome na cédulla i vá vottáre in Bananére.
Bananére nu Guvernimo giá!
#juobananerepresidente
p.s. já temos aliados.
Cantoras e compositoras - Vez por outra bate uma saudade das músicas que ouvia nos anos 80. Foi por causa delas que fiquei um tanto quanto isolado do universo musical mais mainstream dos meus colegas da escola brasileira (claro) e da japonesa (já que todo descendente adolescente quer se integrar e renegar as preferências dos pais).
Lembro-me que passei boa parte dos 12 aos 15 anos ouvindo os LPs do meu pai e as fitas K-7 que conseguia comprar de tempos em tempos, na mercearia japonesa. Naquele tempo, importava-se as fitas de São Paulo que, por sua vez, distribuíam produtos musicais das japonesas Victor, King Denon, Teichiku e, menos frequentemente, uns da Toshiba.
Foi uma época em que eu ouvia qualquer coisa em japonês (e até em coreano, sem saber…um dia eu conto esta). De Enka a J-Pop, músicas folclóricas e até marchas militares. O universo musical que se importava do Japão era amplo. E havia um atrativo adicional: seja um disco ou uma fita, sempre vinham com as letras das músicas.
No início, estas letras eram só em japonês. Foi assim que, em algum dia, notei que a língua japonesa era silábica. Mais pelo final da década, passaram a vir também com a transcrição (não falo de tradução, mas de escrever em letras romanas os sons das letras japonesas), mas aí eu já estudava japonês nas manhãs de domingo.
Era para ser um preâmbulo breve, mas já estamos no quinto parágrafo. Eu só queria mesmo trazer à atenção do(a) leitor(a) alguns nomes que podem ser encontrados pela internet e, quem sabe, dar-lhe uma nova opção musical para passar o tempo. No caso, duas cantoras/compositoras: Miyuki Nakajima e Mariya Takeuchi. Takeuchi, inclusive, colaborou com os Carpenters (quem não se lembra da linda voz da Karen?). Caso você não conheça nenhuma delas, comece por estes verbetes em inglês da Wikipedia.
Além de serem ótimas cantoras, várias de suas composições foram parar nas vozes de gente talentosa como Junko Sakurada (uma das vozes mais simpáticas do J-pop dos 70-80), Kawai Naoko (o sorriso mais cativante das J-idols dos anos 80), fazendo sucesso pelo arquipélago. Pronto, mais duas cantoras dos anos 70-80.
Para encerrar, fique com esta que ouvi muito em uma das fitas K-7 que tive (o nome da música é Koube de aetara ou algo como ‘Se a gente se encontrar em Kobe’), com Junko Sakurada. Talvez o arranjo seja simpático aos ouvidos ocidentais. Experimente.
Shamisen: canções do mundo flutuante - É o melhor lançamento editorial do ano. Pelo menos para mim. Não é só um mangá. É um depoimento de amor à cultura japonesa. Sugiro que o leitor ouça a playlist que acompanha o livro pois os intérpretes não só cantam, mas explicam as músicas.
Os apêndices do livro trazem traduções de algumas das mais belas músicas folclóricas japonesas. Nós passaremos por este mundo, mas a música folclórica seguirá enquanto houver alguém assobiando-as ou cantando-as.
A história do mangá? Digamos que se cria uma ficção em torno da vida dura de Haru Kobayashi (1900-2005), uma goze (estas moças que esmolavam tocando seu shamisen e cantando). Aliás, quando achar que sua vida está ruim, lembre-se da vida dela e, não, como você acabou de ler, ela não viveu no século 17 ou 18, mas no nosso famoso século 20. Sua história de vida impressiona.
Quer conhecer um pouco sobre o shamisen ou sobre a música folclórica japonesa e não encontrou uma referência de fácil acesso, escrita em linguagem não-acadêmica? Então dê uma olhada nessa obra-prima que é este mangá. Você não vai se arrepender. É minha aposta.
p.s. uma outra avaliação minha deste livro está aqui.
Salário e cesta básica - Eis aqui uns questionamentos bem interessantes sobre o sempre generoso salário desejado por um órgão sindical famoso.
Salman - Dica da Bárbara, este texto de Bari Weiss mostra que há um problema a ser investigado. Qual? Alguém precisa explicar como, sem predominância de religião islâmica, a juventude norte-americana (que a brasileira copia) tornou-se tão intolerante.
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É paradoxal, não? A academia, que seria um local de conhecimento e do livre exercício do pensamento, gerou um ambiente de intolerância travestido de uma suposta ‘defesa do plural’. Plural, desde que não atrapalhe a eleição do meu candidato, claro.
Veja este trecho do ótimo texto de Weiss.
The words are violence crowd is right about the power of language. Words can be vile, disgusting, offensive, and dehumanizing. They can make the speaker worthy of scorn, protest, and blistering criticism. But the difference between civilization and barbarism is that civilization responds to words with words. Not knives or guns or fire. That is the bright line. There can be no excuse for blurring that line—whether out of religious fanaticism or ideological orthodoxy of any other kind.
Quer que sua filha ou seu filho viva em um ambiente assim? Não é preciso pegar em armas. Basta fazer sua parte, dentro do que você pode e, acredite, o que você consegue mudar não é pouca coisa não.
Fechando… - Para fechar o boteco, uma dica: geralmente, quando tomo conta de gatos alheios, dou-lhes tratamento especial. E nem cobro (muito a) mais por isto. Amostra? Temos. ^_^
Por hoje é só, pessoal e…até mais ler!
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