Não aprendemos nada com o ensino remoto. E não me refiro a você, aluno, apenas.
Posso ou não estar de mau humor...
Neste v(2), n(23) da newsletter, uma opinião pessoal (obviamente não é institucional, etc. etc.) sobre o que percebo ser uma janela de oportunidade perdida. E outros temas.
O tal do ensino à distância (ou remoto) - No início da pandemia, alguns espertalhões venderam a ideia de que estávamos em um novo normal. Como se o fato de o homem nunca se banhar duas vezes no mesmo rio não fosse um escrito (e objeto de estudo) há milhares de anos.
Mas, insistiram alguns, era hora de mudar tudo porque, afinal, havia uma pandemia. Aproveitando-se das assustadoras imagens dos primeiros dias da pandemia, em que, sem uma vacina, pessoas lotavam os hospitais, bateram na tecla do novo normal.
Um ponto que disseram ter mudado para sempre foi o das relações aluno-professor. Em suas palestras (ou melhor, videoconferências), o ensino presencial estava fadado à extinção. Afinal, a pandemia era como um meteoro se chocando com a Terra.
Vimos que as instituições de ensino superior (IES) privadas rapidamente se adaptaram ao ensino remoto em uma escala mais ampla. Algumas IES públicas (só me lembro agora da USP) também conseguiram perder pouco tempo nisso. E só.
Pois o tempo passou. A curva, que seria achatada mês que vem mostrou-se, temporariamente, mais resistente do que o esperado. Eu disse ‘temporariamente’? Sim. Todo mundo com um pouco de bom senso sabia que era temporário. O problema, claro, é que não sabia quão longo seria este período. Modelos de previsão não estavam tão bem calibrados naqueles dias.
Eu dizia que o tempo passou, não é? Pois passou e o aluguel das instalações, no caso das IES privadas, as mensalidades (cuja justificativa nunca incluiu o ensino à distância) começaram a contrastar com o declínio da ameaça de morte. Se, no início, a esmagadora maioria dos alunos tinha medo de sair de casa, agora não mais.
No período do tal novo normal (que, como vemos, não tem nada de novo), muitos professores, de IES públicas ou privadas, em conversas informais, reclamavam da falta de condições para avaliar adequadamente o ensino. Não falavam disso publicamente por medo de represálias, claro.
O ano de 2022, diferentemente do novo normal (que durou, então, quase uns dois anos?), iniciou-se com o retorno às aulas presenciais. Ouvi histórias de que há gestores perdidos em algumas IES públicas.
Há alguns exigindo que alunos matriculados estejam apenas presencialmente em suas dependências, mas, a despeito de terem cursos nas áreas de saúde, não conseguem, sequer, elaborar um plano para que suas exigências sejam efetivamente cumpridas.
Um exemplo é o da exigência de que todos estejam vacinados, em curto espaço de tempo, ignorando, completamente, a situação dos que, tendo se contaminado, não podem se vacinar de uma hora para outra.
Por sua vez, IES privadas, que nem um único curso de saúde têm, implementam o retorno presencial de forma simples e, arrisco a dizer, até mais seguro do que suas contrapartidas públicas.
Há alunos apavorados e não é porque têm medo da morte (embora, claro, muitos usem isto como desculpa para não dizer o que é que os incomoda). É porque agora terão que fazer provas em sala, sob o controle atento dos professores. Acabou a cômoda situação de se fechar a câmera e fingir que se assistia à aula.
Claro, pode haver algo bom disto tudo. Poderíamos, por exemplo, ter políticas que integrassem o ensino à distância ao cardápio das IES. Afinal, foram dois anos para se experimentar esta opção e pensar no custo-benefício da mesma no cenário em que a vida volta ao normal (o velho, não o novo).
Entretanto, apesar das milhares de videoconferências falando de inovação e novo normal, o que parece ter ocorrido é simplesmente uma mudança de posição do interruptor: desligou-se o modo remoto de ensino (ou ensino à distância, use a nomenclatura que quiser…).
Alguns gestores parecem empenhados em sufocar os benefícios da modalidade remota. Seminários e bancas, minicursos online, aulas online, tudo isso, pelo visto, parece muito mais difícil para os professores agora. As IES nem sempre são espaços de inovação e criatividade, mas estão sempre cumprindo ritos burocráticos. Digo, isto no setor público.
No setor privado, pelo que observo, as IES são mais flexíveis e algumas perceberam que seus lucros podem aumentar com um mix de atividades presenciais e à distância. Ou, alternativamente, mesmo que não o façam agora, uma eventual implementação de inovações neste sentido não enfrentará tantas etapas burocráticas. Não me parece, também, que adotarão um modelo de ensino misto.
Então, no fundo, este é o bom e velho normal. Incentivos diferentes guiam as ações de IES públicas e privadas. Ambas foram submetidas ao mesmo choque: o da pandemia. Ninguém quer falar abertamente sobre os problemas de avaliação no período, mas um estudo sobre o tema daria uma bela tese ou dissertação.
O que é de se lamentar é que parece não haver nem a vontade de se avaliar os resultados desta política de ensino. Seria importante porque minha intuição é que não houve só aspectos negativos no ensino remoto. Mas isto, claro, é minha intuição apenas. Exagero no pessimismo? Mostre-me exemplos concretos de que estou errado. Adoraria não ter razão neste caso.
O valor de mercado da educação pública - Sergei Soares fez um estudo, já há algum tempo, sobre o tema. O valor de mercado é calculado sob três diferentes metodologias e, conclui o pesquisador:
O valor do ensino público no Brasil é algo que se aproxima de 6% da renda das famílias e que é bastante distributivo. Essa conclusão vale para todas as abordagens e, portanto, eu acredito nela. [O valor de mercado da educação pública. IPEA, Texto para discussão n.2532, 2019]
Um ponto a se destacar nesta pesquisa é a clareza retórica do autor. O estilo não é muito usual no meio acadêmico, mas, na minha opinião, é o melhor estilo para se explicar uma pesquisa que, certamente, não é sobre um tema irrelevante…
Lido - Gostaria de dizer que tenho lido algo novo, mas a verdade é que os últimos dias têm sido pouco propícios para uma leitura adequada. Digo isto porque gostaria muito de falar de livros, mas não consigo elaborar nada muito bom para publicar aqui. Então, por enquanto, nada de livros. Prometo tentar voltar ao tema o mais rápido possível.
Já havia escrito o parágrafo anterior quando ganhei o Changing Fortunes de Paul Volcker e Toyoo Gyohten, publicado em 1992. Presentes inesperados que te deixam feliz (e me lembram que preciso voltar a ler outros presentes…).
Dias conturbados - Dias conturbados são aqueles em que você mal tem um intervalo para pensar no que fazer diante de todos os problemas que te atazanam. Nenhum livro de auto-ajuda (ou curso online) dará conta dos seus problemas. Simples assim.
Três é demais - Sofia e Gigi agora estão em companhia da Maria, uma filhote de dois meses. Deve ir para a adoção, dizem-me. Contudo, os dias passam e a relação vai se estreitando. A conferir.
Coisas que eu queria ver - O Volodymyr Zelenskyy abrindo o Saturday Night Live.
Tem culto para eu? - Ri um bocado quando, no meio desta live divertida, alguém soltou esta.
Humor - É…
Por hoje é só, pessoal e…até mais ler!
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