Morre o criador do conceito de 'Restrição Orçamentária Não-Rígida'
Faleceu János Kornai, um economista que poderia ter ganho o Nobel
Esta é uma edição extra que noticia algo triste. Anuncio aos assinantes o falecimento do economista húngaro János Kornai. Fiquei sabendo pelo Twitter.
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Kornai foi a principal fonte teórica da minha dissertação de mestrado, lá no início dos anos 90. O motivo? Barry Weingast e Ronald McKinnon tinham trazido o conceito de restrição orçamentária não-rígida dos estudos da economia socialista para o federalismo. Como eu estudava a economia política da emancipação de municípios em Minas Gerais, bem, nada mais adequado.
No contexto desenvolvido por Weingast e McKinnon em seu Market Preserving Federalism, diz respeito ao governo central não socorrer governos subnacionais endividados (ou não permitir transferências intergovernamentais, dependendo de como você desenha o federalismo). Meu orientador, Ronald Hillbrecht resumiu bem o tema neste ótimo artigo.
Economista húngaro, János Kornai foi autor do que eu gosto de chamar de ‘o segundo mais famoso livro sobre a economia socialista escrito’ - The Socialist System. O primeiro seria aquele, sobre a economia soviética, de Aléc Nove, traduzido, aqui, nos anos 70, pela Zahar Editores.
Como não sou especialista em socialismo, o leitor pode considerar minha afirmação como uma manifestação pura e simples de meu entusiasmo. Por outro lado, não se esqueça que ele mereceu um número inteiro da Public Choice em sua homenagem recentemente (abril/21).
O conceito de restrição orçamentária não-rígida (soft budget constraint) diz respeito, originalmente, ao fato de que empresas socialistas não tinham restrições orçamentárias como as empresas das economias de mercado. A cada sinal de fracasso, o governo socorria a estatal. Por isso o caráter soft de sua restrição orçamentária.
Não é difícil ver como isto poderia ser usado em outros contextos. Entre nós, o prof. Rogério Werneck, da PUC-RJ é quem, se bem me lembro, falava do conceito adaptando-a à economia brasileira dos anos 90 (nos jornais, naquela época de pouca internet).
Outros autores famosos trabalharam o tema da restrição orçamentária não-rígida (ou frouxa)a. Richard Quandt (autor do clássico manual de microeconomia dos anos 80) e Gerárd Roland (o economista francês estudioso da transição das economias socialistas) são dois bons exemplos.
É difícil fazer um bom obituário. Certamente Tyler Cowen fará um ótimo no seu Marginal Revolution. Mas eis uma curiosidade. Recentemente, conversando com Jorge Vianna Monteiro (outra fonte teórica da minha dissertação de mestrado), descobri que o mesmo se comunicou com Kornai lá nos anos 70 (ou início dos 80).
Esta foi uma coincidência inesperada que me fez refletir um pouco sobre a graça da vida (mesmo na pesquisa, se é que me entende o humor sem graça que cultivo há anos…). Pensar nisto agora me deixa um pouco triste, o que não deixa de ser curioso…
Ah sim, para finalizar, lá nos anos 90, eu, num arroubo de entusiasmo pela Ciência Econômica, fiz um papel de parede com os prêmios Nobel e, claro, incluí János Kornai (é o segundo, no canto inferior direito, após Solow e antes de North).
Segue reproduzido abaixo, como homenagem póstuma ao grande economista húngaro.
Eu pensei em colocar mais uns links, mas vou deixar assim mesmo. Estou um pouco ocupado nesta noite (o próximo número chegará a você na quarta). Entretanto, fica aqui o registro de meu pequeno agradecimento a Kornai com esta pequena edição extra.
Descanse em paz, János Kornai.