Abandonar um gato - Dias de sol...e sol - Realista - Censura - Trump em guerra contra si mesmo?
Adolf Eichmann se defendeu dizendo que apenas cumpria ordens. O que isto nos diz sobre o cumprimento das ordens? Não seja criativo, apenas siga a Hannah Arendt.
Eis o v(4), n(37) desta suposta newsletter. Será que ela existe mesmo? Estaria no Brasil ou na Argélia? Eu nunca sei. De todo modo, vamos ao que interessa que são as diversas receitas de bolos de banana. Ou de bananas. Aliás, alguém com saudades do Juó Bananére? Eu estou.
Abandonar um Gato - Indicação do Sr. Adalberto Queiroz, o pequeno livro é um conjunto de recortes (ou fragmentos, melhor dizendo, já que a imagem de um recorte me parece mais controlada pelo autor do que um fragmento, ao menos poeticamente falando) de memórias do famoso Haruki Murakami (o qual eu nunca havia lido até então).
Muitos parênteses, não? Vamos evitá-los (Vamos, vamos!). O fio condutor das histórias é a relação do autor com seu pai. Uma relação que, em algum momento, sem muito detalhamento, enfraquece para ser recuperada por ambos já no final da vida do pai, doente, mas lúcido.
O livro começa com uma gata a ser abandonada e termina com um gato cujo destino o autor desconhece. No primeiro caso, o autor é uma personagem ativa. Já no segundo, é basicamente um espectador. Não sei se foi intencional da parte do autor, mas é irônico que, no primeiro caso, a gata a ser abandonada reage e, no último, o gato atuante desaparece.
Há momentos em que, na vida, agimos e obtemos o resultado oposto ao esperado. E há também aquelas em que não agimos por não acharmos importante e, depois, quando a curiosidade vem, ficamos a imaginar possíveis resultados. É assim com gatos, com Murakami, com você e comigo.
Dias de sol e…sol - Você já sabe, mas não custa avisar: tá quente demais! O pessoal da produção me avisa aqui que o problema não é o calor, mas a falta de umidade do ar (e de humildade das pessoas, dizem alguns). Com a secura vêm os problemas respiratórios e aumentam as vendas de hidratantes (o setor agradece e pede menos umidade e, bem, sobre a humildade ele não se pronunciou ainda).
No último final de semana almocei em tradicional restaurante da cidade (que mudou de endereço após anos…), tomando uma cerveja de trigo e arriscando uma sobremesa que não chegava nunca. É um paradoxo? Veja, fui um dos primeiros a chegar ao estabelecimento e, portanto, experimentei um atendimento cortês, atencioso mesmo. Não que fossem me carregar no colo, mas o garçom parecia me ver como um freguês novo (de fato…fazia anos…) e, portanto, com bom potencial de consumo.
O prato veio caprichado e, animado com a cerveja (cujo efeito parecia maior com o calor, embora eu tenha ficado nos 600 mililitros), pedi uma sobremesa que era, basicamente, uma tortinha de maçã com uma bola (uma bola moderada, não uma bolona, vai!) de sorvete. Algo rápido de se preparar, não? Pois aí estava o problema. O restaurante havia enchido de gente. Suspeito que, sabendo da minha presença, as mulheres solteiras (e até algumas casadas) tenham decidido terem a honra de me admirar pessoalmente. Ou talvez haja outro motivo, mas eu não consigo imaginar nada tão simples e natural quanto minha poderosa hipótese.
O fato é que a sobremesa demorava, demorava… Assim, tive que fazer gestos (calma! Não são aqueeeeeles gestos!) ao garçom, tentando, com a habilidade de um mímico fracassado, dizer-lhe que tinha pressa e que tinha que me retirar. No fim, a sobremesa veio e ela não foi saboreada como deveria porque eu realmente já estava sonhando com um cochilo. O restaurante é bom, os garçons não fazem feio, mas o final da experiência foi, sim, frustrante.
De todo modo, o calor e a umidade baixa seguiram pelo resto do final de semana e ainda estão aqui, fazendo-me pensar se uma temporada no Alaska não seria uma boa idéia (com acento e se não gosta, pague multa de R$ 50 mil ao dia!).
Realista - Rapidinho: não é “realística”, mas “realista”, né? Então, não é “determinística”, mas “determinista”. Reis do Português, por favor, confirmem (ou não). Obrigado.
Censura - No final da década dos 80, em pleno ‘regime de exceção’, ‘regime militar’ ou ‘ditadura militar’, eu comprava um jornal de um partido de extrema-esquerda na banca de jornal e cuidava para que não me vissem com ele…inutilmente. Os militares, que jamais tiveram a competência (e nem a tecnologia) de vigilância como seu ponto mais alto, não tinham nem como proibir um jornal de esquerda (e existiam vários) em uma banca de jornal, quanto mais verificar quem os comprava.
Na televisão, onde a censura se fazia presente por uma ficha, no início de cada programa, com a assinatura de algum censor, assistíamos ao programa do Agildo Ribeiro ou ao ‘Planeta dos Homens’ (com Jô Soares, Paulo Silvino e outros) fazendo mil e uma ironias com os militares e com os políticos que, à época, foram obrigados a permanecerem na legalidade apenas se estivessem em dois partidos: o de oposição (MDB) e o da situação (ARENA). Muitos da extrema-esquerda encontraram guarida no primeiro e o mesmo para a extrema-direita, no segundo.
Pichações em muros contra a ditadura? O tempo todo. Pedidos pela ‘abertura’ (referiam-se à abertura democrática que o último presidente, o antipático general Figueiredo, disse que haveria sim senhor e que prenderia e arrebentaria quem fosse contra, em uma irônica e truculenta defesa da democracia). É verdade que, em um artigo cujo nome me escapa, um famoso cientista político disse que o que houve em 1964 não foi uma luta entre democratas e autoritários, mas sim entre autoritários de esquerda e de direita (e os escritos e ações da extrema-esquerda, nos anos 60 e 70 corroboram sua visão). Os democratas, estes estavam espremidos entre os extremos. Não vejo como discordar dele.
O final da ditadura foi um período em que pessoas muito diferentes, ideologicamente falando, uniram-se nas manifestações de rua pelo fim do regime de exceção. Naquele tempo, não que fosse fácil, mas eram mais comuns os diálogos entre esquerda e direita (e depois da abertura, a esquerda passou a ganhar uma hegemonia nos debates e diálogos). Acreditávamos que todos tínhamos como máxima a famosa: não acredito em nada do que dizes, mas defenderei até a morte o teu direito de dizê-lo.
Ao longo dos anos ficou cada vez mais claro que esta máxima não é levada a sério por muito mais gente do que eu imaginava. A judicialização de tudo (os fundos públicos que os partidos ganham às custas de nosso trabalho barateiam-lhes os custos de judicializarem qualquer tema e nem vou comentar os incentivos da elite do funcionalismo público, cujos enormes ganhos monetários foram bem estudados no último livro do Bruno Carazza) veio juntamente com a radicalização e polarização e não me arrisco a dizer quem causou quem. Só sei que estão juntas.
Além disso, anos de domínio da extrema-esquerda no ensino médio (e básico?) plantaram o discurso do ‘nós’ contra ‘eles’ (que, aliás, caracteriza o fascismo, como diz a capa de um livro sobre o tema que se encontra por aí, nas livrarias da vida…), vendendo uma visão (uma única visão, aliás) de que a sociedade é um jogo de soma zero, onde alguém só ganha se o outro perde, o que é, no mínimo, um erro grotesco (onde estão as outras visões?) e, no limite, uma falácia. Contrapõe-se o extremismo da linha-dura militar dos anos da Guerra Fria com outro extremismo. Bela decisão! O que poderia dar errado, né?
Chegamos ao ponto em que todos têm medo de criticar autoridades, temem por seus empregos se chamarem um amigo de ‘negão’ ou se usarem uma expressão como ‘e aí, bichona’ até com seus amigos mais íntimos. A hipocrisia é que dizem respeitar todas as gerações, mas os mais antigos são reprimidos, tendo seus hábitos e gírias julgadas ou mesmo proibidas. Quem acusa o outro de etarismo, em geral, é quem mais o pratica. Não é que se defenda a pessoa idosa. Defende-se apenas a pessoa idosa que se curva diante das vontades dos jovens engajad(inh)os, que se humilha e se nega enquanto ser humano para sobreviver na sociedade que lhe prometeram ser mais ‘tolerante’.
Tudo é agressão, tudo é micro agressão e, portanto, a liberdade de expressão só pode ser…fascista. Afinal, se tudo é agressão, deve haver um agressor e, claro, ele não é o campeão de mortes da história mundial (que é o socialismo, dizem os dados. Você pode não gostar, mas é. Viva com isso, cresça!), mas é um bom espantalho.
Os astros se alinharam para que a extrema-esquerda (a que está no poder agora, no controle das principais instituições) e a extrema-direita (alijada e perseguida, o que só lhe aumenta a atratividade como opção ideológica, pois tudo que é proibido…) peçam, cada qual à sua maneira, por mais ‘cala a boca’ de seu adversário. Liberdade de expressão? Ah, isto é fascismo. Calem a boca de todos.
A censura é o caminho mais fácil, mas se políticos, militares e tantas outras autoridades que juraram cumprir a Constituição estiverem alertas, não haverá censura que passe. Não correremos o risco de que alguns rasguem a Constituição abrindo espaço para que outros façam o mesmo com outras leis. Defender a soberania nacional não é o mesmo que defender o soberano do feudo e, às vezes, a soberania nacional não é sinônimo de nobreza, bondade ou sabedoria. A Alemanha de 1933 que o diga. A URSS que o diga. O Camboja que o diga. O Chile da ditadura que o diga. Mais alguém quer dizer algo? Sem VPN, por favor…
Trump em guerra contra si mesmo?- O general McMaster conta um pouco de sua experiência na administração Trump.
Por hoje é só, pessoal e…até mais ler! (*)
(*) “até mais ler” foi plagiado do Orlando Tosetto, cuja newsletter, aliás, você deveria assinar.
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