A maior invenção do mundo. Amor incondicional. Lei de Benford e as eleições. Outros.
O equilíbrio fiscal, o mercado, uma urna, um papagaio e um judeu entram no bar...
Eis o v(2), n(91) da newsletter. Vamos logo que hoje é sábado.
A maior invenção do mundo - O inventor levantou a taça de champanhe, triunfante. Sua equipe o acompanhou. Finalmente, tinham terminado a maior invenção do mundo. Orgulhosos, brindaram e se dispersaram. O dia havia sido trabalhoso.
No dia seguinte, o departamento de registros encaminhou ao escritório de patentes a documentação da maior invenção do mundo. O pessoal das vendas se abasteceu de alguns exemplares da mesma e saíram em peregrinação pelo país.
Ah sim, eu não dei detalhes desta invenção, não é? Bem, com ela, muito trabalho manual era poupado e os ambientalistas ficavam felizes porque também se gastava menos papel. Os vendedores, claro, acrescentavam algumas meias mentiras sobre sua eficiência, inclusive, em termos de economia de energia.
A maior invenção do mundo foi parar na televisão, em um popular programa de entrevistas. A plateia ficou estupefata com as supostas vantagens em relação às alternativas. O apresentador, muito sagaz, perguntou ao vendedor sobre a possibilidade de falhas e defeitos. Afinal, a humanidade nunca havia visto uma invenção autoimune a falhas.
O vendedor levantou-se, ajeitou o paletó, e, com o dedo em riste, disse que jamais a invenção teria um defeito, pois era a maior invenção do mundo. Que duvidar disto era até uma heresia, um pecado mortal.
O apresentador insistiu e o vendedor se ofendeu. Saiu pisando forte em meio à entrevista. Os telespectadores se dividiram: uns achavam que a maior invenção do mundo não era lá estas coisas e outros diziam que a invenção era mesmo infalível.
O vendedor e a alta direção da empresa foram até os tribunais. Exigiam que não fosse permitido insinuar que a maior invenção do mundo tivesse defeitos. Um juiz, muito nacionalista, orgulhoso da invenção nacional, convenceu-se e, no dia seguinte, os jornais publicavam o novo normativo, condenando à prisão quem insinuasse que a maior invenção do mundo tivesse a menor possibilidade de não ser infalível.
A população ficou dividida, embora alguns defensores da infalibilidade da maior invenção do mundo começassem a pensar que, racionalmente, talvez existisse alguma possibilidade de falhas, já que a invenção fora concebida por seres humanos. As acusações aos que defendiam que talvez pudessem existir falhas iam de ‘negacionistas’ a ‘fascistas’, passando por ‘traidores’ ou ‘lunáticos’.
Surgiu então um terceiro grupo, que passou a defender uma posição mais radical, qual seja, a de que pessoas que, eventualmente, pensassem que a ciência envolvesse dúvidas, incertezas, ou temas polêmicos - como duvidar da infalibilidade de uma inven..perdão, da maior invenção do mundo - deveriam ter suas identidades apagadas e seus empregos tomados. Era um grupo que se nomeava como ‘os defensores da diversidade de opiniões’ porque eles não-ironicamente, acreditavam que era isso que faziam.
A coisa se complicou muito. Livros que defendiam a não-infalibilidade humana eram queimados em praças públicas. As desavenças trouxeram brigas campais e violentas entre os diversos grupos. Surgiu um movimento religioso, defendendo a tese de que a infalibilidade da maior invenção do mundo era um sinal de que o povo do país era o escolhido de Deus.
O inventor, a esta altura, estava entristecido com tudo aquilo. Tudo bem, ele não gostava de admitir que sua invenção não fosse a maior de todas (e, portanto, infalível). Mas ele também não achava que sua invenção não pudesse apresentar falhas.
Tentou explicar isto aos seus vendedores e aos diretores que, surpreendidos, chamaram a polícia para prendê-lo. Algemado e cabisbaixo, foi acompanhado pelos policiais até uma viatura. Foi quando se ouviu uma grande explosão. O prédio da empresa criadora da maior invenção do mundo estava tomado pelas chamas. É que alguns exemplares da maior invenção do mundo haviam explodido.
O inventor chorou, desesperado.
Até hoje não se sabe o motivo da explosão. Além disso, o governo decretou sigilo sobre o caso e as pessoas que estavam no prédio - e que sobreviveram - desapareceram do país. Para não despertar suspeitas, o ministério da informação lançou uma nota oficial com uma explicação mentirosa sobre as explosões.
Algum tempo depois, com a patente regularizada, a maior invenção do mundo foi transferida para uma empresa estatal que alegava criar inovações para a sociedade. Foi produzida por muitos anos neste seu novo lar, às custas dos impostos. A discussão, então, passou a ser se a invenção deveria ser produzida com insumos exclusivamente nacionais ou não.
Nem a economia, nem as relações interpessoais na sociedade do país da maior invenção do mundo avançaram muito em relação ao resto do mundo. Com o tempo, o orgulhoso povo do país empobreceu e a qualidade dos governos caiu bastante. Parece que exportaram sua invenção para apenas mais dois dos 195 países do mundo.
Até hoje se vangloriam de que foi em seu país que se criou a maior invenção do mundo.
O amor incondicional - Foi de repente. Veio arrebatador e ocupou não só seu coração, mas as veias, artérias, pele, pelos, enfim, tudo nele foi contaminado pela paixão. Com mais um tempo de convivência, a paixão se consumiu e, das cinzas, veio o amor. Não qualquer amor, mas o amor incondicional. Seria capaz de pular da ponte se ela assim o requisitasse. Entendeu, finalmente, o que era amar sem condicionantes. Não escolhera amá-la. Apenas amava-a. Chegava a passar mal ao não estar ao seu lado por muito tempo.
Seus planos de vida passaram a contar com sua presença. Não concebia mais viajar, morar, ou mesmo respirar, sem ela. Se houvesse uma explicação para isso, eu arriscaria que o cupido, por engano, usou todas as suas flechas nele. Mas cupidos não existem. Digo, não que eu saiba. Nunca vi um (além disso os revisionistas acham que cupidos disseminam a violência e têm feito uma campanha para que não se fale mais de anjos com arcos e flechas).
E o amor incondicional não diminuía. A cada dia, enlouquecia um pouco mais. O amor passou a não mais caber em seu corpo. Nem em sua alma. Transformou-se na mais genuína manifestação do amor. Só faltava soltar faíscas (ou raios, afinal, raios são mais legais, né?). Queria sofrer com ela, curtir com ela, jantar com ela, almoçar com ela, dormir com ela, acordar com ela, viajar com ela. Tiraria sua vida por ela.
O amor incondicional, contudo, não vem gratuitamente. Há um preço a ser pago, dependendo de cada pessoa. Em seu caso, o preço foi que o amor incondicional não a impressionou. Toda aquela energia caiu em solo infértil. Não aguentando de tanto amor, em uma bela noite de sexta-feira, aconteceu dele simplesmente explodir. Bum!
Mas de seu corpo não saíram tripas, pedaços do cérebro, ossos e sangue. Nada disso. Apenas uma luz muito intensa saiu de seu corpo e ficou brilhando por horas, até se dissipar. O amor incondicional se foi tão rápido quanto veio.
Às vezes, amar demais, digo, incondicionalmente, pode trazer consequências inesperadas.
Lei de Benford é aplicável a dados eleitorais? - Nem sempre. É o que diz o Leo Monasterio. Claro, estou aguardando os advogados e os juízes dizerem que é preciso regulamentar a Lei de Benford.
Novo livro - Vem aí um novo livro. A mensagem é clara: a esquerda precisa se reconstruir e voltar ao centro. Nos últimos anos, capturada por elementos radicais, foi amarrada ao identitarismo. Sorte que há esquerdistas como Risério. Pode a extrema-esquerda ser contida?
![Twitter avatar for @barbara_maidel](https://substackcdn.com/image/twitter_name/w_96/barbara_maidel.jpg)
![](https://substackcdn.com/image/fetch/w_600,h_314,c_fill,f_auto,q_auto:good,fl_progressive:steep/https%3A%2F%2Fbucketeer-e05bbc84-baa3-437e-9518-adb32be77984.s3.amazonaws.com%2Fpublic%2Fimages%2F184f72f5-0227-48f8-8a0a-77a1b6631e0f_1024x683.jpeg)
Rolando Boldrin, adeus e obrigado - Deixou-nos nesta semana. O caso abaixo é uma dica do Luigi Marnoto.
Peter Thiel - O polêmico Peter Thiel em uma entrevista no Uncommon Knowledge.
Por hoje é só, pessoal e…até mais ler! (*)
(*) “até mais ler” foi plagiado do Orlando Tosetto, cuja newsletter, aliás, você deveria assinar.
Caso queira compartilhar, clique no botão abaixo.
Talvez você seja novo por estas bandas. Rapidamente: publico duas vezes por semana, geralmente às quartas e sábados. Eventualmente há algumas edições extraordinárias. Assinar (custo = R$ 0.00 + valor do seu tempo para apertar o botão subscribe com seu endereço de e-mail lá…) me ajuda bastante. A temática? De tudo um pouco. Confira os números anteriores aqui.